Da verdadeira festa que é a noite das eleições autárquicas, várias foram as peripécias e várias são as leituras possíveis. Portanto, sem perder mais tempo, vamos a elas.
Continua a ser patético ouvir a líder do PSD reclamar vitória, num sufrágio em que o seu partido perdeu cerca de vinte autarquias, e literalmente para o seu concorrente directo, o PS. Chega a dar pena, ver a Manuela Ferreira Leite numa tentativa desesperada de parecer sincera e convencida do que está a dizer. É cómico ver os principais assistentes da líder tentarem também desesperadamente contornar as principais derrotas das referidas eleições, valorizando algumas vitórias supostamente importantes.
A verdade é esta: o PS é obrigatoriamente o vencedor destas eleições. Porque teve mais votos, porque conquistou mais autarquias que nas eleições de 2005 e porque ainda conseguiu vitórias importantes em câmaras tradicionalmente de outros partidos - nomeadamente a Leiria do PSD e a Beja da CDU. Para além disso, é importante perceber que em cerca de 60 câmaras o PSD concorre coligado com o CDS-PP, pelo que é natural que obtenha alguma vantagem em relação às outras forças políticas.
Portanto, não tenho dúvidas nenhumas de que a responsabilidade de mais uma derrota eleitoral do PSD - e em tão pouco tempo - é da sua líder, Ferreira Leite. Primeiro porque fez más opções na escolha de alguns candidatos - Leiria será, porventura, o melhor exemplo. Segundo, e mais importante, porque continua a não saber, ou a não ser capaz, de dar um rumo claro ao seu partido. Um partido, já agora, cansado, sem ideias e em que toda a gente tenta abandonar o barco.
Os tubarões do PSD assumiram uma postura de outsiders que fragiliza qualquer líder que se atreva a pegar na direcção da coisa, e que descridibiliza a própria organização. Luís Filipe Menezes paira triunfante sobre o seu partido. Alberto João Jardim admite na televisão que o PSD Madeira é um partido autónomo e que nada tem a ver com o que se passa no continente. Pacheco Pereira e Marcelo Rebelo de Sousa não são mais do que meros
opinion makers que sacodem constantemente os ombros e se ilibam de quaisquer responsabilidades partidárias. Santana Lopes, outro eterno afastado das grandes decisões sociais-democratas, acaba por ser um derrotado triunfante nestas eleições, já que consegue um bom resultado na câmara de Lisboa, consequência de uma boa campanha eleitoral. Santana gosta de política, isso já se sabe, e gosta de uma boa competição, honrada, educada e sem ataques pessoais de baixo nível. Não foi suficiente para vencer António Costa, mas chegou para provar a Ferreira Leite o que é necessário para se ser um político com carisma. É obvio, Santana não é um político com uma carreira lá muito saudável. Tem personalidade, mas não é eficaz e acaba por ser isso que dita o seu afastamento do centro nevrálgico do PSD.
Conclusão: Manuela Ferreira Leite tem de se pôr a andar e rapidinho. O PSD é claramente um partido envelhecido. Tanto no que diz respeito aos tubarões como no que diz respeito aos autarcas. E chegamos a outro claro erro de casting da líder: afastar Pedro Passos Coelho. Sobre isso, os meses que se seguem falarão bem melhor do que eu poderia aqui fazer. Veremos...
Continuando: a CDU levou nas ventas mas afirma que foi uma vitória; o BE foi totalmente arrasado, como era de esperar, aliás; o PP é o partido do atrelado, isto é, concorre quase totalmente ao colo do PSD. Fora isso, resta referir a derrota do Avelino e da Fátima Felgueiras, a perda da maioria absoluta do major e a reeleição de um senhor que, se tudo correr bem, vai parar à cadeia não tarda nada.
Portanto, o PS vence, Sócrates vence, e o PSD, apesar de continuar a ser o partido com mais autarquias, perde as eleições. Três eleições, duas derrotas para Manuela Ferreira Leite e duas vitórias - embora não esmagadoras - do senhor Sócrates deixam uma coisa bem clara: o PS, pese embora todos os defeitos, tem uma estratégia, tem objectivos, e parece ter vontade de lutar por eles. Está organizado e é, aparentemente, um partido mais jovem e com mais figuras do que o PSD. É assim a atirar para o mauzinho, mas dá garantias que os sociais-democratas parecem não querer dar. Pelo menos não demonstram qualquer esforço de concertação, unidade e harmonia.