kar(ma)toon

Bom Karma... ou não!

terça-feira, agosto 31, 2010

NÃO VÁS POR AÍ

Não vamos sabendo muito da política interna dos EUA. Não sabemos frequentemente o índice de popularidade de Barak Obama, não sabemos se tem cumprido com o que prometeu em campanha, ou se está a falhar. Não sabemos se vai conseguir recuperar a economia americana ou se, pelo contrário, a vai enterrar ainda mais. O que sabemos é que parece ter entrado no sistema de comunicação política que é tão caro aos americanos e que manda fazer para ficar bem; ir onde é simbólico; dizer, não o que se quer ouvir, mas o que está para lá disso e que não interessa para nada.

Cinco anos após a tragédia de New Orleans, a cidade foi reconstruída. Ou melhor, a cidade turística foi recuperada, porque os bairros onde os turistas não vão, esses, ainda estão à espera das obras mais básicas. Ainda assim, Obama foi a New Orleans falar de como está tão contente pela recuperação da mítica cidade e de como New Orleans passa a ser o símbolo de renovação e New Orleans para aqui e New Orleans para ali etc e etc e etc. E não passam de patacoadas, boas para os media falarem bem e mal do presidente.

É uma pena que Barak Obama tenha optado por este caminho. Uma pena e um sinal inequívoco de que as coisas não lhe estão a correr como desejava.

segunda-feira, agosto 30, 2010

KARMABOX WITH A VIEW - THE DIVINE COMEDY - AT THE INDIE DISCO

O regresso da banda irlandesa não podia ser melhor. O single de apresentação do novo álbum, respectivamente "At The Indie Disco" e "Bang Goes The Knighthood", é altamente trálálável, muito contagioso e cumpre com as regras de ouro das composições de Neil Hannon, plenas de arranjos clássicos e orelhudos. É um dos singles do ano, indiscutivelmente.

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Pediram-me para fazer a divulgação e eu, que sou bom moço e ainda acredito no valor dos outros, faço sem questionar. E é isto, basicamente o que têm de fazer é ir ao Auditório da Biblioteca Municipal Orlando Ribeiro, em Telheiras, no próximo dia 4 às 22 horas e pronto. Quer dizer, têm que pagar, não é...

domingo, agosto 22, 2010

CINEMINHA DE VERÃO

Os filmes de verão estão diferentes. Decididamente. Normalmente o verão representava a silly season do cinema; as comédias mais ridículas, os blockbusters mais imberbes e os filmes infantis mais insuportáveis, sem esquecer os piores filmes-de-gaja alguma vez imaginados, enchiam as salas de cinema de Julho a Setembro. E continua a ser assim, não nos enganemos.

No entanto, 2010 inverteu um bocadinho essa tendência e trouxe alguma qualidade mesmo aos filmes típicos de verão. Entre a sala de cinema e a pirataria mais desavergonhada, já fui surpreendido por algumas vezes. Os filmes são os que se seguem...

A primeira (e maior) surpresa chama-se "The A-Team". E acreditem, até eu tenho de ler duas vezes o que escrevi para ter a certeza de que era mesmo isto que queria escrever. Mas é mesmo verdade, o filme que recupera uma das séries de maior sucesso dos anos 80, realizado por Joe Carnahan - o homem que para efeitos comerciais apareceu ao mundo com o excelente "Narc" e entretanto já assinou o hiper-excessivo "Smokin' Aces" - é desde já um dos filmes mais divertidos e despretensiosos do ano.

É um blockbuster de acção, sem dúvida, mas é um blockbuster bem realizado, com um sentido de humor genial, servido por um grupo de actores em ritmo de pura curtição e que é ao mesmo tempo a mais singela e sentida homenagem à tal série de televisão. Diverte e entretém, ou seja, cumpre os seus objectivos a 100% e deixa a vontade - e a quase certeza - de haver pelo menos uma sequela.



Sequela que é mais que certa no que diz respeito a "Salt". E por várias razões. Desde logo porque o filme deve estar a ser um estrondoso sucesso comercial por toda a parte. Depois, porque tem uma Angelina Jolie absolutamente fantástica e a dar o litro. E por fim, porque dá ao mundo um novo e irresistível action hero, Evelyn Salt.

A história, e todos os elementos, caminhos, enganos e surpresas, são matéria de pura banda desenhada. De tal forma que a Salt de Jolie se parece tremendamente com uma outra personagem feminina da Marvel, Black Widow. A agente russa(!) da S.H.I.E.L.D., e que apareceu pela primeira vez no cinema na sequela de "Iron Man", tem de facto demasiadas parecenças com Evelyn Salt, agente russa infiltrada nos EUA e que acaba por se tornar agente da C.I.A. mas que nunca deixa de ser realmente fiel à pátria mãe, mas que acaba por se enamorar pelo país que a recebeu e que...

Enfim, falar destas trocas e reviravoltas seria um enorme e desagradável spoiler, pelo que me fico por realçar o argumento de "Salt", bem escrito e engenhoso o suficiente para nos manter presos ao ecrã. A recuperação da esquecida guerra fria é também um elemento tão querido da banda desenhada americana, e acaba por ser um dos elementos mais fortes e interessantes do filme.

Para além disso, o realizador, Phillipe Noyce, está mais do que habituado a filmes de acção e espionagem; conhece as fórmulas deste género de cinema e sabe muito bem como levar o seu filme para um caminho onde a única saída... é a sequela. E "Salt" merece uma série de filmes. Ou melhor, Evelyn Salt merece não uma mas várias sequelas.



"Repo Men" é decididamente o grande filme deste verão e um clássico imediato do cinema de ficção científica. Realizado por um desconhecido Miguel Sapochnik, que até à data só tinha uma curta e um videoclip no currículo, "Repo Men" segue o imaginário e a estética tão reconhecidas de Phillip K. Dick e um dos temas preferenciais do autor, os ciborgues.

Num futuro próximo, uma companhia americana detém o monopólio do transplante de orgãos, ou melhor, da troca de orgãos defeituosos por orgãos cibernéticos, caríssimos e que dificilmente poderão ser pagos pelos transplantados. Quando isso acontece e os pacientes falham os pagamentos, a companhia manda os Repo Men para literalmente recuperarem o que é propriedade da empresa. E recuperam, seja lá como for.

Portanto, o que temos é um filme de humor negro, negríssimo, extremamente equilibrado, que nunca perde o gás e que se mantém sempre interessante e empolgante. E não é todos os dias que um filme destes, com subtís toques da melhor série B, tem ao serviço actores do calibre de Jude Law, Forrest Whitaker e Liev Schreiber. E Jude Law está realmente muito bem no papel de um Repo Man que a dada altura, e por causa de um «incidente» infeliz, se arrepende de tudo o que fez até à data e resolve mudar radicalmente de atitude.

"Repo Men" é completamente obrigatório, e um "Blade Runner" do século XXI. Já sei que os indefectíveis da obra-prima de Ridely Scott nunca aceitariam esta opinião, mas a verdade é que o filme de Sapochnik, mesmo sem a carga poética e filosófica de "Blade Runner", marca úm género que andava meio mortiço e sem identidade. E deve ser visto da forma mais justa, ou seja, despretensiosamente e com um balde de pipocas na mão.



Sobre "The Fourth Kind" não posso dizer nada. Porque dizer o mínimo que seja estraga o filme para quem ainda não o viu. Falarei de "The Fourth Kind" depois de estrear nas salas portuguesas, mas posso desde já adiantar que é um dos grandes filmes do ano. Ou melhor, é um dos filmes que marca 2010...

quinta-feira, agosto 19, 2010

"NATURE FINDS ITS WAY"



Entretanto, em Navarra, um touro saltou a vedação que o separava das bancadas e desatou a mandar gente para o hospital, alguns em estado grave. Isto quando na Catalunha a lei que proíbe as touradas foi aprovada e entre em vigor em 2012. É um exemplo que o mundo devia seguir o quanto antes. Apesar de ser uma lei movida por interesses meramente políticos e regionalistas, tem um resultado práctico sem paralelo na luta pelos direitos dos animais.

segunda-feira, agosto 16, 2010

CURTO E GROSSO



Isto do Freeport cheira tão mal que só pode ser merda.


Há dias, na fila de um importante supermercado que gosta que a gente «vá lá», uma senhora à minha frente pagava as suas compras. Três embalagens de Toblerones, treze(1) barras de chocolate da respectiva marca do supermercado, um saco de extrafofos - na verdade mini-croissants - gomas e outras porcarias que tais. Ao pagar pediu factura, a senhora da caixa pediu-lhe o número de contribuinte e após introdução do mesmo confirmou o nome da instituição: "Escravas da Eucaristia?", perguntou. Ora bem, duas perguntinhas: a gula não é pecado mortal? E não deviam estas senhoras devotas contratar um marketeer ou assessor de imagem que arranjasse um nome mais, sei lá, positivo e que não sugerisse a escravatura promovida pela fé?


Nas ruas do Porto, cartazes anunciam a Corrida do Homem e da Mulher... Não se devia chamar somente... corrida?

domingo, agosto 08, 2010

O PACHECO É ESTÚPIDO



Tenho assistido, ao longo das últimas semanas, à guerra instalada entre Pacheco Pereira e algumas pessoas, de uma forma ou outra, relacionadas com as artes, provocada pelos textos que o mesmo publicou no seu blog. Não tinha ainda feito nenhum comentário na esperança de que a guerra escalasse para níveis ainda mais interessantes. À falta de novidades escaldantes, comentários mais ou menos revoltados ou, uma nova acha de Pacheco, decidi então dizer de minha justiça.

Começando pelo mais básico, o autor dos impropérios. Pacheco Pereira é um dos muitos opinion makers fabricados à pressão por um país com um enorme défice de opinião própria. Não que não os haja noutros países, os opinion makers são o produto de uma sociedade de comunicação em constante procura de mais informação. O problema é que em Portugal os opininon makers são politizados, dão-se demasiada importância e, no limite, são muitas vezes fúteis - sobre isto falarei num post futuro.

O caso de Pacheco Pereira é bastante gráfico e exemplificativo do opinion maker que se considera muito importante e que retira prazer da polémica gratuita. A sua persona televisiva é, aliás, bastante conhecida por isso mesmo: é intratável, arrogante e bastante presunçosa. Pacheco gosta disso.

Quanto ao texto que Pacheco publicou no seu blog - e que pode ser lido
aqui, tenho de admitir que concordo com uma das coisas que por lá se pode ler. O "bla-bla do «culturalês»" a que o autor se refere, é de facto algo que me irrita sobejamente e a prova de um excesso de altivez tão do agrado de alguns representantes da cultura nacional. Há muito que os artistas aprenderam a usar esta linguagem para comunicar os seus projectos, intenções e objectivos. Não se sabe se tiveram de a aprender, e assim dar resposta à burocracia estatal que lhes é imposta por quem lhes dá os tão aguardados subsídios, ou se a usam para confundir, condicionar e convencer os espectadores de que aquilo que fazem e apresentam é realmente importante e de qualidade - e muitas, muitas vezes não é.

Este é, no entanto, o único ponto da dissertação de Pacheco com que concordo. Tudo o resto é um chorrilho de parvoíces indignas de alguém com dois dedos de testa. Desde logo, começando pela primeira frase do texto: "Olhando para os encontros dos “artistas” que venceram a Ministra encontramos um dos mundos menos conhecidos e escrutinados da vida pública portuguesa". Esta, das duas, uma, ou é mentira propositada, ou ignorância pura. Então não sabe Pacheco Pereira que os artistas e o seu trabalho são escrutinados pelo público que paga para os ir ver? Não é fácil perceber que não há, aliás, melhor e mais directa forma de escrutínio?

De resto - e para fugir às aborrecidas citações de um aborrecido texto - Pacheco revolta-se contra a forma fechada como o mundo dos artistas funciona, ergue-se na defesa dos interesses do povinho, que, segundo ele, quer saber como esta classe gasta os dinheiros públicos, e fala do mundo da arte e da cultura como um enorme e profundo grupo secreto, que se reúne em masmorras, sacrifica virgens em missas negras e bebe sangue em noites de lua cheia.

Será que Pacheco Pereira se preocupa com a forma como o erário público é gasto, por exemplo, pelos organismos públicos, autarquias, partidos políticos e políticos e deputados? Dinheiro que, diga-se, é substancialmente superior ao que anualmente é entregue aos artistas e produtores culturais? Será que Pacheco Pereira é estúpido ou simplesmente ressabiado?

Pessoalmente gosto de acreditar que a primeira hipótese é a mais acertada; detestaria saber que os políticos portugueses - os que já não fazem parte do panorama político nacional e os que ainda estão agarrados à teta - têm mau perder e fazem birra por tudo e por nada. Não há nada pior que imberbes no poder, certo?

Sim, é verdade, os artistas são geralmente arrogantes, dão-se demasiada importância e reagem muito mal à crítica. Os estudantes de interpretação, por exemplo, aprendem muito cedo esta arte do pretenciosismo. No entanto, não é menos verdade que ser artista em Portugal obriga a criar uma série de anti-corpos e a reagir antes de ser provocado. A verdade é que em Portugal a palavra "subsídio" tem uma conotação negativa e miserabilista e que pinta uma imagem de pobreza franciscana que só sobrevive à custa de esmolas que, na realidade, não deveria existir.

Esta arrogância da comunidade artística provavelmente só é uma realidade porque o pouco dinheiro que existe para a cultura portuguesa é um osso para mil cães. Alguns desses cães são demasiado pequenos, e talvez por isso, esse osso acabe sempre para ir parar aos dentes dos mesmos. Esta concorrência está longe de ser pacífica ou construtiva, e por essa razão, a cultura portuguesa é uma ávida praticante da autofagia.

Arrogantemente afirmo: o Teatro Universitário do Porto não está dependente do erário público de uma forma directa. Não podemos concorrer ao subsídio e a única forma que dinheiro do Estado entra na nossa conta é através da mensalidade paga pela Reitoria da Universidade do Porto. Agrada-me esta semi-independência, especialmente porque, com muito menos dinheiro, fazemos espectáculos superiores em qualidade a muitos de grupos profissionais.

Ou seja, o segredo não está no subsídio do Estado. A qualidade não depende obrigatoriamente do dinheiro do povo. A questão é que os profissionais têm de ser pagos e também são contribuintes. Contribuintes como os que Pacheco parece querer defender. Contribuintes que têm menos regalias e iguais obrigações e que acima de tudo querem trabalhar para ganhar a vida. É isto que a estupidez de Pacheco não o deixa compreender.

sábado, agosto 07, 2010

O FINAL



Várias são as conclusões que se retiram de "Toy Story 3". Várias e indiscutíveis. Desde logo que este é claramente um dos melhores filmes do ano - algo a que a Pixar já nos habituou. Depois, também como já tem vindo a ser usual, que estamos no território da animação, sim, mas não no de animação infantil. Há muito tempo que os argumentistas da companhia americana deixaram de escrever histórias dirigidas aos mais pequenos para se dedicarem a temas que só um adulto pode compreender totalmente; a forma como as embrulham, essa sim, agrada a pais e filhos.

Outra conclusão evidente é que a Pixar é a única produtora de cinema capaz de criar sequelas melhores que os filmes anteriores. "Toy Story 3" é claramente o melhor filme da série, e a todos os níveis, diga-se. Para além disso, a Pixar consegue, como poucos agentes cinematográficos, produzir blockbusters e filmes de autor com a mesma qualidade e brilhantismo. Os Toy Story são nitidamente blockbusters de verão ou de Natal; "Ratatouille" foi a ponte entre este cinema mais comercial e o cinema de autor tão bem representado por "Wall-E" e "Up".

A conclusão mais fácil de todas prova que a Pixar, sem esforço de maior, consegue, a cada novo trabalho, deixar a concorrência a largos anos-luz de distância. Nada nem ninguém consegue uma tão maravilhosa conjugação de elementos. A Pixar é o exemplo máximo de como é possível fazer um filme tecnicamente irrepreensível, bem realizado e ainda melhor escrito.

Por tudo isso, a última conclusão é esta: em 15 anos e 11 longas metragens a Pixar fez mais pelo cinema do que muitos realizadores, actores e produtores.

"Toy Story 3" pode não ser o melhor filme da Pixar - não era esse o objectivo, com certeza - mas é brilhante a todos os níveis. É mais adulto, aborda questões importantes, como a dor do abandono e da separação, e ainda consegue uma série de referências (não tão evidentes) a clássicos do cinema, em estilos tão diferentes como o western, os filmes de fugas de prisão, o terror e uma maravilhosa homenagem - esta um bocadinho mais clara - a Frankenstein. Tudo istgo e muito mais em pouco mais de hora e meia de um filme que rapidamente nos leva das gargalhadas ao nó na garganta e à lagrimazinha inevitável.

É um filme perfeito, sem defeitos a apontar e uma nova colecção de cenas antológicas. Toda a meia hora final; a forma como é «filmada» e construída e o ritmo que impõe ao espectador por si só mereciam todos os prémios do mundo. E depois há essa ideia absolutamente magnífica de transformarem Buzz Lightyear em El Buzzo, espécie de canastrão espanhol com todos os tiques de toureiro bailarino de Flamenco - situação que resulta em algumas das cenas mais cómicas do filme e que culmina com uma versão cigana dos Gipsy Kings para o tema principal do filme; de "You've Got a Friend In Me", de Randy Newman, passa para "Hay Un Amigo En Mi" absolutamente irresistível e altamente dançavel.

"Toy Story 3" é um dos melhores filmes do ano e tem muito a ensinar a todos os tipos de cinematografias. Ir vê-lo é obrigatório, quanto mais não seja porque as personagens merecem a despedida. Despedida que marca fortemente o final do filme e que é tão bem encenada pelo realizador, Lee Unkrich. Confesso: na cena final, em que Andy se despede dos seus brinquedos, e enquanto algumas lagrimazitas me escorriam cara abaixo, senti saudades daquelas personagens. Acho que esta é mesmo a melhor forma de definir o efeito Pixar.




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quinta-feira, agosto 05, 2010


Poderia começar este post afirmando que "Inception" é o melhor filme do ano. Não o faço porque honestamente... não sei. Não sei nem como começar a falar do novo filme de Christopher Nolan e sinceramente, se soubesse, não saberia como o explicar. Pausa...



Com poucas certezas e dúvidas suficientes - que não são bem dúvidas mas nem isso consigo explicar - para o ir ver, pelo menos, uma segunda vez, atiro-me então a uma tarefa hercúlea: escrever sobre o filme mais enigmático dos últimos anos - espaço temporal que igualmente não me sinto preparado para definir. Tentando por tudo fugir aos terríveis spoilers.

"Inception", no mínimo, é desconcertante; não respeita a narrativa formal de qualquer filme ou história. Não que não tenha um sentido único, com princípio, meio e fim. A questão é que do princípio ao fim da história nunca sabemos o que estamos realmente a ver, onde estamos, para onde vamos e, basicamente, o que raio se está a passar afinal. Mas isso é assumido desde muito cedo por Nolan, quando nos apresenta o primeiro «esboço» de um labirinto. Não podemos dizer que não estavamos avisados.


De facto, somos conduzidos por um labirinto demasiado complicado para o desvendarmos sem ajuda divina. Esse é um dos encantos do filme e também um dos seus problemas: a dada altura a confusão é tanta que o cérebro ameaça entrar em stand by e simplesmente ficar à espreita do que está para vir. Sentimo-nos literalmente observadores e nada mais. É arriscado, o jogo que Christopher Nolan nos propõe; ariscado porque o perigo de perder o espectador é real e elevado.



Ainda assim, "Inception" é um dos filmes mais estimulantes do ano, desta eu tenho certeza. Desde logo porque é incrivelmente bem filmado. Nolan já nos tinha habituado à forma irrealmente real como filma cenas de acção e acção é coisa que não falta aqui. Acção nervosa, rápida, intensa e, mais uma vez, tão bem filmada que até chateia e que tem o condão de nos fazer acreditar que está mesmo a acontecer.

O argumento, apesar da já referida confusão, é brilhante e muito bem exposto, muito bem construído. As peças do puzzle - metáfora não intencionada - surgem rapidamente, sem dar tempo para questionar ou respirar, e rapidamente damos por nós a pensar (ingénuos) que já percebemos tudo e estamos prontos a arrancar. Nada mais falso. Os loops, reloops, voltas e reviravoltas, avanços e solavancos, kicks e etc é que nos transportam. Mas, como numa montanha russa - segunda metáfora sem querer - não temos qualquer controlo sobre nada e somos meros crash test dummies amarrados ao assento de um carro a alta velocidade sem travões.

Existe algum desconforto nesta posição, claro, pouco que estamos habituados a este tipo de cinema-experiência. Mas a vida é mesmo assim, e é melhor ser surpreendido do que continuar a ser um balofo e preguiçoso cinéfilo que acredita não mais ser surpreendido por nenhum cineasta. Para alem disso, visualmente "Inception" é um jaw breaker descomunal, não só pelos elaboradíssimos efeitos visuais, como pelas cenas de acção a que já fiz referência - e que são totalmente artesanais - como pelo imaginário que nos é mostrado. Somos mantidos em parmanente estado de admiração e já não muitos realizadores capazes de um feito destes.

"Inception" é, acima de tudo um grower; um objecto que vai melhorar de cada vez que pensar nele. Um daqueles filmes com tantos pormenores e detalhes e com tantos pormenores e detalhes que não vemos mas que temos a certeza que estão lá, que torna impossível qualquer primeira leitura clara e acertada. Da mesma maneira, é um clássico imediato da ficção científica, repleto de cenas antológicas - a do corredor do hotel, desde logo, a maior de todas - destinado a mexer com a cabeça de quem o quer ver como é; que tem o objectivo de pôr à prova o espectador mais experiente.

No entanto, "Inception" tem uma regra, que Christopher Nolan respeita escrupulosamente: é um heist movie, filme que trata de um simples plano de assalto e em que o grupo de ladrões é composto por vários indivíduos, cada um deles especialista numa determinada área. Nesse sentido, tudo aqui é bastante claro e não somos de modo algum enganados. É de um roubo que se trata, mas não de um roubo normal, concretizado por pessoas invulgares e de forma absolutamente revolucionária.

Já assumi: vou ver "Inception" novamente. É obrigatório, não outra hipótese. Até porque não consigo falar do que vi de forma concreta. Não consigo destacar os componentes do filme como habitualmente faço. À excepção de um, esse, inquestionável: a banda sonora é mesmo a melhor do ano, e até aí se podem procurar truques e segredos.

Sinto-me perdido, e é uma pena não ter um «totem» à mão, dava cá um jeito - esta é mesmo só para quem já viu o filme...










<a href="http://music.zackhemsey.com/track/mind-heist">Mind Heist by Zack Hemsey</a>

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terça-feira, agosto 03, 2010

Afinal estavam todos a dormir e já se tinham esquecido de como é o dia-a-dia no Afeganistão. Já lá vai tanto tempo, não é? Pelos vistos parece que ainda morre por lá gente, torturam-se mulheres e outras aberrações do género. O problema é que existem milhares de mulheres como Aisha que sofrem estas e piores torturas e em quem ninguém pensa. O problema, o maior problema, é que amanhã já ninguém vai pensar nisto. E sobre este assunto estamos conversados.
Agora...
Tenho todo o respeito e admiração pela Time Magazine, que considero ser uma das melhores publicações a nível mundial. NO entanto, os editores da Time sabem bem desta curta memória do povo e sabem ainda melhor como usá-la a seu favor e a favor de outros interesses menos claros e assumidos. Uma imagem vale mais do que mil palavras, já se sabe. Esta capa da Time - para além de se tornar imediatamente em mais uma capa histórica - tem o condão de conquistar imediatamente o coração dos leitores que, altamente condicionados, partem para a leitura do título do artigo. É nesse momento que a manipulação da opinião pública é executada na perfeição.
"What Happens If We Leave Afghanistan" podia ser uma pergunta mas não é. É uma afirmação. Isto é o que vai acontecer quando deixarmos este país não passa de uma perversidade; um logro a favor desses tais interesses menos claros e não assumidos. A imprensa sempre teve esta qualidade de criar e/ou fazer mudar opiniões. Numa altura em que cada vez mais a nação americana pressiona o executivo de Obama no sentido da retirada total das tropas deste país - especialmente numa semana em que o próprio presidente veio a público afirmar a intenção de cumprir o prazo estipulado para sair completamente do Iraque, a 31 de Agosto - capas como a da Time Magazine conseguem facilmente mudar o rumo dos acontecimentos.
Para além de que o real problema não é os americanos deixarem o Afeganistão. O país é enorme e os soldados das forças internacionais nunca foram capazes de o controlar verdadeiramente. Coisas como a que fizeram a Aisha, acontecem todos os dias bem nas barbas do «Exército de Paz», pelo que o título correcto para o artigo da Time devia ser algo do género "Vejam algo que se passa todos os dias e que ninguém - nem mesmo nós, americanos - consegue impedir".
Por tudo isto, as manifestações de repúdio, horror e choque que se têm feito sentir um pouco por toda a parte, parecem-me desajustadas, repentinas e, no limite, tardias. O adormecimento do povinho continua a dar mostras de não querer mudar, e esse é o principal ingrediente para que os media - e os seus batedores, os opinion makers - mantenham uma tão elevada taxa de sucesso na manipulação que levam a cabo.