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Bom Karma... ou não!

quinta-feira, março 26, 2015

AH, OS FILHOS DA PUTA...



Há um senhor que escreve no Manifesto 74. Chama-se António Santos e tem a vertebralidade de um atrópode. Escreve o senhor no dito blog acerca de assuntos comunistas; escreve com o coração, comunista, e com a alma, comunista também. Não escreve, e é pena, com a coluna vertebral de muitos comunistas.

O senhor António escreveu há uns dias uma espécie de crónica em que colocava 19 pertinentes questões. Se qualquer um de nós respondesse afirmativamente a cinco dessas questões isso seria um sinal inquestionável de que somos filhos da puta. Está giro e tal, percebe-se a mensagem, é certo, e o ataque aos que o senhor António considera serem os filhos da puta da nossa sociedade, sem dúvida. O problema não é tanto o que o senhor António escreve, mas aquilo que se segue ao que o senhor António escreve.

Destaca-se, desde logo, o facto de o senhor António ter retirado da sua espécie de crónica quase todas as fotografias de personalidades públicas que tinham lá sido colocadas para exemplificar cada uma das questões colocadas. Ele era governantes, políticos, empresários, enfim, a fina nata daqueles a quem o povo chama filho da puta. Presumo também que sejam estes os que mais facilmente telefonam aos seus advogados a fazerem queixinhas de moluscos como o senhor António e que, por essa mesma razão, o senhor António se terá posto fino e para não sofrer quaisquer tipos de represálias lhes apagou os retratos – alguns de altíssimo nível e elegância estonteante.

Ou seja, esta coisa de se dizer o que se quer porque a internet nos protege do lado de lá de um ecrã, aparentemente, e a dizer pela atitude do senhor António, não deve sossegar todos os que querem dizer o que querem. O senhor António claramente não se sentiu sossegado. Ou isso ou alguém do blog lhe disse «põe-te fino, Toni» ou algum advogado amigo lhe disse «abispa-te, Tóno». E o senhor António abispou-se. Ou melhor, abispou-se mais ou menos que eu não tenho a certeza do alcance do poder de queixa da moça Le Pen – uma das duas sobreviventes da borracha higiénica do senhor António.

O senhor António e outros como ele metem-me o mais nojentos dos nojos. Têm muita coragem mas por dois minutos, que a seguir vem a caganeira e correm para se agarrarem à saia da mãe – e entendam por mãe o que acharem mais indicado. E a coragenzinha que levou o senhor António a retirar o que tinha feito – foi ele que fez, era ele que o devia assumir sem medos – é a mesma que o leva a escrever, no espaço dedicado aos comentários, a seguinte pérola de que Castro tanto se orgulharia: Em resposta a algumas perguntas, aqui e ali deixadas, informo que censuro e continuarei a censurar quaisquer mensagens de natureza fascista.

É um comunista de mão cheia, este senhor António. Um dos bons velhos tempos, daqueles que acham que oposição é lixo, que a sua opinião é doutrina, imbatível e inquestionável e que se alguém levantar a voz para a desdizer não merece outra coisa que não o cárcere. O senhor António é um filho da puta de um fascista de esquerda que infelizmente veste a camisola política de um partido que tudo tem feito para merecer gente desta – como todos os partidos fazem tudo para merecer os filhos da puta que lá têm, militantes, simpatizantes, etc.

Filhos da puta há muitos e de muita espécie. O senhor António, no entanto, passa a ser um dos tipos de filho da puta que mais me chateiam e o Manifesto 74 um ninho deles que me irrita e revolta por representar o que de pior existe na política: a cegueira fundamentalista.

A título de exemplo e para terminar, que já escrevi demasiado sobre esta raça de gentinha, uma outra crónica do senhor António. Esta, sobre o aniversário do PCP e sem nada de especial a apontar, continha num dos comentários o tipo de cegueira de que falo. O comentário? Este: Parabéns pelo texto, e parabéns todos os dias ao PCP. Só não concordo com a escolha da música, embora adore o Zeca Afonso, na minha opinião devias por uma música de alguém do partido.

terça-feira, março 24, 2015

A BESTA



A história é universalmente conhecida: lá na escola há um puto que não é particularmente popular. Não é simpático nem educado, alias, é até bastante estúpido e insuportavelmente arrogante. É filho de pais ricos, no entanto, o que lhe garante a casa com piscina e campo de ténis com que pode atrair «amigos» e é alto e espadaúdo, o que certifica que, quando se aborrece ou é contrariado ou não tem nada melhor para fazer pode sacudir os mais medrosos com ameaças mais ou menos violentas ou mesmo uns safanões vistosos. É uma besta, mas é uma besta com o poder que lhe permitem ter. Neste caso, o remédio era a maioria dos alunos da escola agir em absoluta concertação e isolar o animal, fazer de conta que ele e a casa dos papás e os músculos impróprios de um rapaz daquela idade não existiam e pura e simplesmente isolá-lo. Deixá-lo sozinho a falar para as paredes, a exercer o seu falso poder sobre os cestos do lixo, uma alma solitária penada, sem ninguém, sem ninguém, sem ninguém. Não durava muito tempo e passava a ser uma memória distante de algo que incomodava e que já só lembrado para as inevitáveis piadas de putos e para dar o exemplo.

O mesmo se devia fazer a Israel. Isolar um país daqueles e levá-lo ao esquecimento era o melhor que se podia fazer. Um mundo perfeito seria um mundo em que todos os países do mundo boicotassem completamente a nação de Israel. Boicote aos vistos turísticos para entrar e sair do país, boicote aos vistos de trabalho dentro e fora do país, boicote aos artistas israelitas, aos cientistas e investigadores israelitas, boicote às importações e exportações israelitas, nem mais um figo comprado, nem mais uma aspirina vendida. Fechar Israel bem dentro daqueles muros de que tanto se orgulha. Não mais reuniões políticas e empresariais, não mais conferências de paz, não mais uma cadeira que fosse na ONU ou em qualquer outra organização, governamental ou não. Isolamento total e implacável do resto do mundo. 

Parece violento? Parece, sim senhor. Muita da população israelita provavelmente não tem culpa das decisões dos sucessivos governos nacionais. Não tem culpa e não concorda. Nem a população nem os artistas, nem os cientistas, nem os investigadores. Mas alguém vota nas eleições e elege estes terroristas tornando-os terroristas legais. Alguém vai às urnas legitimar um estado racista, xenófobo, violento, prepotente e apostado, pelas últimas notícias, em aumentar decididamente o tom da violência na região. E portanto teria muito pouca ou nenhuma pena da população israelita se o cenário idílico acima descrito se concretizasse de alguma maneira. 

É violento? É. É bastante. Mas não é mais violento do que o que Israel faz à Palestina e, desenganem-se, se acharem que não, ao resto do mundo. É claro, Israel não o faz sozinho e sem aliados de peso. Aliados que, como os putos na escola, têm medo do galifão, têm interesse na «amizade» do boçal e não conseguem nem querem, na verdade, dizer-lhe que não. Eu, que já esgotei toda a paciência e crença numa resolução pacífica para o problema que é Israel – e não o problema Israel-Palestina, como todos lhe chamam – ficaria muito contente por ver o país dos escolhidos por Deus encerrado dentro de quatro paredes, deixado a definhar sozinho, sem amigos, sem ajuda, teimosamente à espera da vinda do Salvador à terra só para perceber que a vinda dele não era a salvação prometida mas sim um tiro de misericórdia que não merece. Israel em chamas provocadas pela ira justiceira do Deus deles. Isso sim seria um sonho tornado realidade. 

quarta-feira, março 04, 2015

UMA HOUSE OF CARDS PELA ESCADA ABAIXO



Parece ser um problema incontornável das séries de televisão, principalmente das made in USA: a dada altura tudo o que foi construído com qualidade, rigor e critério, dispara escada abaixo aos trambolhões e com estrondo. No caso da magnífica House of Cards a queda deu-se à terceira temporada – o que parece dar razão à teoria de um amigo que defende que as duas primeiras temporadas são escritas de uma vez para ver no que dá e que a terceira, em virtude do sucesso das que lhe antecederam, é rabiscada a correr muito para alimentar os fãs sedentos e aproveitar a onda positiva. No caso de House of Cards, no entanto, isso pode não ser verdade, tendo em conta os doze meses de intervalo entre a segunda e a terceira temporadas. e se não for verdade, então o acidente é ainda mais incompreensível.

E não havendo maneira de dizer isto de forma simpática, permitam-me uma introdução suave: House of Cards continua a ser filmada com uma mestria absoluta, bem escrita, interpretada por actores intocáveis no seu trabalho e servida por uma banda sonora arrepiante de boa. O que é que falha? O que não podia de modo algum falhar: o argumento.

A terceira temporada da série apadrinhada por David Fincher é chata, desinteressante e desencantada consigo própria. Não tem energia, não tem ritmo nem dinâmica; perdeu todo o veneno, os jogos de bastidores desceram ao nível do mais simples humano e o suspense morreu. House of Cards é hoje mais previsível que o pior episódio de Anatomia de Grey; é uma série rendida ao mais comum dos clichés, chegando ao ponto de ressuscitar memórias de uma guerra fria que ficou para sempre congelada na era Reagan. O duelo entre presidentes dos EUA e da Rússia, que ocupa nesta terceira temporada um considerável pedaço da intriga, chega a ser ridículo de tão bacoco e bafiento.

Não há como entender o que se passou no curto prazo – na verdade anormalmente longo – que separa o que foi um dos maiores fenómenos da produção televisiva americana deste objecto perfeitamente dispensável. É uma queda brutal e que não deixa antever melhoras breves, especialmente se tivermos em conta que a quarta temporada não foi sequer anunciada ao mundo. Por outro lado, o mesmo já aconteceu com outras séries de igual ou maior valor. Breaking Bad e Sons of Anarchy, só para não me alongar nos exemplos, tiveram temporadas absolutamente aborrecidas e que não pareciam ir a lado nenhum e sobreviveram-lhes, reinventaram-se e voltaram à boa forma inicial. É o que se deseja a House of Cards. Que se esqueça rapidamente do trambolhão ou que se esforce muito por o reconhecer para que o possa usar para se catapultar para uma quarta temporada que nos permita, espectadores atentos, esquecer que houve uma terceira.