kar(ma)toon

Bom Karma... ou não!

quarta-feira, outubro 29, 2014

HOMELAND: A MORTE DO ARTISTA



Homeland faz parte da história da televisão americana e é, ao mesmo tempo, a mais fiel representação da história das séries de televisão americanas. E uma história que se conta a correr: primeira e segunda temporadas totalmente obrigatórias, incontornáveis e provavelmente o melhor que alguma vez foi escrito para televisão. Terceira temporada rapidamente a resvalar para uma pasta lodosa e inconsequente em que nada avançava, nada se passava e em que quase nada interessava. Durou esta modorra até ao episódio final que deveria ter realmente sido o fim da série, por muito que isso custasse aos seus indefectíveis seguidores. Não foi. E assim chegamos à quarta temporada, que nunca deveria ter existido e que só serve para nos provar que a terceira era de facto o ponto final na história daquelas personagens e que tudo o que viesse a seguir era a mais. 

A quarta temporada de Homeland é na verdade a primeira de outra série qualquer. De uma série em que espiões americanos e paquistaneses fazem joguinhos de poder atrás de janelas entreabertas, em mesas de café fumarentos e em hotéis de luxo colonialista. É uma série desinteressante, gasta, mastigada e cuspida e mastigada novamente, vista e revista em dezenas de outras séries e filmes de Hollywood. Não tem assunto, não tem foco, não tem objectivo e não tem personagens, porque estas, desta série, tinham utilidade e objectivo numa outra, anterior a esta e que as alimentava com um sem número de situações e de relações que nos mantinham agarrados ao ecrã e ao sofá. Esta não tem nada disso e é só um enorme bocejo em que já nada faz sentido. 

A metáfora é tão fácil que até custa escrevê-la: Homeland morreu com o sargento Nicholas Brody pendurado pelo pescoço num guindaste no último episódio da terceira temporada. E deveria ter ficado morta. Recuperá-la para isto é o mesmo que ressuscitar um velho amigo do mundo dos mortos e tê-lo lá em casa sentado no sofá a encher tudo de baba e outros fluidos típicos dos mortos-vivos, sem se fazer útil, sem servir para nada, nem para um inocente jogo de sueca. Um desperdício.

terça-feira, outubro 28, 2014

A PUNHETA



Sempre admirei Pier Paolo Pasolini. Não gosto de nenhum filme seu e o teatro que escreveu não me provoca overdoses de vontade de o ir a correr encenar. Esclarecida que está a minha posição relativamente ao artista italiano, apetece-me dizer o seguinte: espero sinceramente que Jorge Louraço Figueira estivesse bêbedo (ou que tenha um retorcido humor nórdico) no momento em que apelidou John Romão de “o representante de Pasolini na terra”. Eu, que não estou morto, dei trambolhões dentro do meu caixão, pelo que só posso imaginar que o falecido PPP, depois de ter andado às cabeçadas às tábuas do seu invólucro, encontrou forma de sair de lá de dentro e se encontra já a caminho do Porto para uma pequena conversa com o escritor/jornalista/cronista/crítico do Público.

A crónica/crítica/peça precisamente intitulada (lá está) O representante de Pasolini na terra, escrita por Louraço no Público do passado dia 27 e em que o autor discorre acerca de Teorema, o novo espectáculo daquele encenador português, é um bom exemplo da dupla-dupla punheta, uma práctica muito corrente entre críticos e encenadores deste país e que há anos é o miolo da relação da imprensa portuguesa com as suas artes performativas.

Passo a explicar: a primeira punheta é o espectáculo levado a cena por um determinado criador e que mais não é do que uma masturbação egoísta e solitária de um grau de intelectualísse insuportável. Punheta número um.

Punheta número dois, o texto que lhe é dedicado por um jornalista embevecido e deslumbrado, ajoelhado perante o trabalho inalcançável pelo comum dos mortais, com acesso exclusivo a quem tiver cartão do clube dos hipsters da intelligentsia do lobby da teatrice burgueso-lisboeta. Punheta número dois, portanto.

Punheta número três, o acto isolado de quem, como Jorge Louraço, escreve uma crítica enquanto sonha com uma carreira literária de sucesso e cantarola baixinho o I’m a lumberjack and I’m ok dos Monty Python.

É esta a nata da crítica de teatro em Portugal. Indivíduos que escolhem o que querem ver, sobre o que querem falar, que assumidamente dizem não a uma série de espectáculos, encenadores, companhias e festivais de teatro e gritam sim a uns quantos eleitos; que assim almejam atingir um estatuto de exclusividade de estrela da crítica, que querem ser temidos, que querem entrar no foyer do Rivoli e ouvir o seu nome repetido centenas de vezes em sussurro por quem os reconhece e a quem é melhor fazer todas as vontades na esperança de que possam descer à terra e assistir a um ensaiozito de dez minutos e escarrar umas quantas postas da mais fina literatura nas páginas dos jornais mais respeitados. São estes os nossos críticos de teatro, indivíduos que queriam muito era ter uma carreira na literatura, venderem milhares de cópias e serem chamados para conferências pelo mundo fora.

São estes os punheteiros da crítica em Portugal, o par perfeito para todos os punheteiros do teatro português. É este o casamento de capa de revista cor-de-rosa que alimenta o teatro e as artes performativas de um país que do que menos precisava era destes ecossistemas fedorentos. O espectáculo de John Romão? Permitam-me recorrer ao português mais curto e assertivo para vos falar dele: o espectáculo de John Romão é uma bela merda!

sexta-feira, outubro 03, 2014

DEMASIADO NADA PARA FAZER

Incomoda-me muito o fascismo. De todos os ismos é o que mais me incomoda, só ultrapassado pelo bruxismo, que é aquela coisa de ranger os dentes enquanto se dorme e que me provoca arrepios da pior espécie. Não gosto de fascismo, não suporto fascistas e chateia-me que ainda exista fascismo aqui e ali pelo mundo fora – mesmo no mundo democrático, mesmo que não em regimes políticos mas em comportamentos e formas de pensar. Tudo em relação ao fascismo me incomoda. E incomoda porque conheço o seu papel na história e alguns dos seus rostos. Conheço e não tenho nenhuma intenção de enterrar a cabeça na areia e fingir que nunca existiu para que não me incomode. Por outro lado, lembrar-me do fascismo não é glorificá-lo nem tão pouco eternizá-lo de forma elogiosa. Só uma mente desabitada poderia acreditar numa barbaridade dessas. Como parecem ser as mentes dos deputados do PCP e do BE, desabitadas e cheias de tempo livre para saírem das cabeças onde vivem e irem por esse mundo fora a preocuparem-se com assuntos que, verdade seja dita, não parecem ser vitais para a qualidade de vida da população.

A polémica em torno da exposição de bustos de presidentes é mais um exemplo de como os deputados são demasiado bem pagos para o que fazem. Se esta gente tem tempo para desencadear uma verdadeira micro-guerra civil por causa de uma exposiçãozita onde surgem as carantonhas de alguns presidentes fascistas, então só posso concluir que: ou não há nada para fazer no parlamento ou não há nada para fazer no parlamento e os deputados destes partidos querem a todo o custo dar nas vistas e enganar quem anda mais distraído e passar a imagem de que são trabalhadores incansáveis. Não são. São um bando de meninos conhecidos por serem eternamente e permanentemente e muito facilmente ofendidos, que querem acima de tudo, e por motivos diferentes, dar nas vistas, gritar bem alto seja o que for para parecer que estão a reclamar de alguma coisa importante. Os do PCP porque é essa a sua natureza – e que às vezes é útil, justiça lhes seja feita. Os do BE, porque ninguém lhes liga nenhuma e vai daí comportam-se como o puto mais puto do grupo de putos, que ainda não fuma mas quer ser tão popular como os putos mais crescidos.

Aos preocupados deputados de PCP e BE deixo a seguinte sugestão, para que possam pensar sobre ela enquanto mastigam um bolinho de bacalhau num dos cafezitos ali ao lado da assembleia e, quem sabe, propô-la ao hemiciclo: queimem-se todos os livros escritos por fascistas e todos os livros de história que fazem referência a ditadores, nacionais ou internacionais. Destruam todas as obras de arte de alguma maneira associadas ao fascismo ou a fascistas, todos e quaisquer cartazes do Fidel Castro, que não é fascista, não senhor, mas que também não é nenhum paladino da democracia. Vamos fazer uma grande pira ao estilo nazi e mandar para lá tudo o que é fascista e que nos faz tremer de medo à noite quando estamos enterrados nos lençóis à espreita de uma qualquer sombra ameaçadora.

Se não quiserem ser tão extremistas, a solução é também ela muito simples e fácil de pôr em práctica: deixem pura e simplesmente de falar em fascismo. Eu próprio, a partir de agora vou eliminar a palavra         nesta crónica. Se não falarem em         ele deixa de existir. Podem até negar qualquer conhecimento de         ou de           de hoje ou de outrora. Façamos todos de conta que o         nunca existiu que pode ser que dessa forma ele nunca mais venha a existir. Toda a gente sabe que a melhor maneira de acabar com um problema é fazer de conta que ele não existe. «Devo dinheiro a quem? Às finanças? Não sei quem é…».

Vou seguir o exemplo dos senhores deputados do PCP e do BE, que arreliados com a ameaça do         fazem de conta que ele não existe, e farei o mesmo com os senhores deputados, com todos eles. A partir de hoje nego a sua existência ou sequer o conhecimento de que alguma vez os tivemos no nosso país. «Deputados? Não sei do que fala.» A partir de hoje deixo de acreditar que tais criaturas existem e pode ser que assim me deixem de dar cabo da vida e da paciência.