FOXCATCHER - O QUE ESTÁ PARA VIR
Foxcatcher é bom. É um bom filme de um realizador que não
filma muito – desde 1998 assinou um documentário, uma curta documental e três
longas-metragens – mas que consegue (quase) sempre atrair a atenção de público
e crítica. O quase ali em cima refere-se a Moneyball, de 2011, obra muito
aclamada mas que foi na verdade um desvio ao que parece ser a real assinatura
de Bennett Miller. E que assinatura é esta? É uma de frieza quase clínica, tão
evidente em Capote e agora neste Foxcatcher e que faz do seu um cinema de
poucas falas, planos gélidos e quase fantasmagóricos, acompanhados por bandas
sonoras que pairam sobre as imagens sem as incomodar, quase sem se fazer notar;
preenchido por personagens com inúmeras camadas, nem todas evidentes mas quase
nunca surpreendentes. O cinema de Miller é, por tudo isto, um caminho certo,
com final anunciado, previsto e temido, mortal.
E por isso começo pelo final para dizer que por tudo isto, e
ao contrário de tanta gente, não me desiludi com o final de Foxcatcher. Não por
ser um espectador visionário, daqueles que pela experiência adquirida é capaz
de adivinhar o final de um filme, mas porque Foxcatcher dedica hora e meia a mostrar-nos
que aquilo, aquela história, não tem como acabar bem. É uma tragédia
inevitável, uma espiral de violência implodida a cada curva e que deixa pelo
caminho um rasto claro do que está para vir.
Este cinema, o de Bennett Miller, é construído de maneira a
que todos os seus elementos nos conduzam para um mesmo fim. Como já referi
anteriormente, o ambiente, a imagem e o som dos seus filmes trabalham em
conjunto, são um só veículo em velocidade controlada, muito controlada, com um
destino marcado e hora de chegada cumprida à risca. E é neste veículo que
entram os actores – em Foxcatcher como em Capote, de 2005 – cumprindo
escrupulosamente as regras do jogo, que existem, novamente, para que o seu
propósito seja consumado.
Neste ponto não posso deixar de destacar a tremenda
injustiça que tem sido todo o falatório em torno do desempenho de Mark Ruffalo
e Steve Carrell – especialmente deste último – e o esquecimento claramente
propositado de Channing Tatum, inquestionavelmente o melhor de tudo o que há de
bom no filme. Tatum é magistral no desenho que faz de um homem também ele em
constante implosão, em permanente contenção; um tímido bruto, uma infantil máquina
de força dentro do corpo de um gigante com vergonha de abrir os braços ou de
dar passadas mais largas. Tatum carrega o filme às costas porque é a sua
personagem que carrega a tragédia anunciada às suas e é, mais uma vez e sempre,
grandioso. É uma das interpretações do ano. Maior e melhor, desde logo, que a
do seu colega, Carrell, que consegue a nomeação ao Óscar simplesmente porque a
Academia adora uma boa transformação física. Transformação física que não foi
capaz de detectar no corpo de Channing Tatum, essa sim realmente impressionante
e que não necessitou de tanta prostética. Sem meias palavras: Tatum merecia a
nomeação e concorria directamente contra Michael Keaton pelo boneco dourado.
Foxcatcher é bom. É um bom filme de um realizador que não
filma muito mas que quando o faz, faz bem. E que leva o tempo que acha
necessário para construir a sua carreira, da mesma forma que leva o tempo que considera
útil para contar as histórias que lhe interessam. Este filme, espera-se, é o
retomar do caminho começado em Capote e que sofreu um desvio tão esquecível
como, percebemos agora, insignificante. Esperemos (ansiosamente) pelo próximo
trabalho para perceber afinal para onde caminha Bennett Miller.