A PUNHETA
Sempre admirei Pier Paolo Pasolini. Não gosto de nenhum
filme seu e o teatro que escreveu não me provoca overdoses de vontade de o ir a
correr encenar. Esclarecida que está a minha posição relativamente ao artista italiano,
apetece-me dizer o seguinte: espero sinceramente que Jorge Louraço Figueira
estivesse bêbedo (ou que tenha um retorcido humor nórdico) no momento em que
apelidou John Romão de “o representante de Pasolini na terra”. Eu, que não
estou morto, dei trambolhões dentro do meu caixão, pelo que só posso imaginar
que o falecido PPP, depois de ter andado às cabeçadas às tábuas do seu
invólucro, encontrou forma de sair de lá de dentro e se encontra já a caminho
do Porto para uma pequena conversa com o escritor/jornalista/cronista/crítico
do Público.
A crónica/crítica/peça precisamente intitulada (lá está) O representante de Pasolini na terra,
escrita por Louraço no Público do passado dia 27 e em que o autor discorre
acerca de Teorema, o novo espectáculo
daquele encenador português, é um bom exemplo da dupla-dupla punheta, uma
práctica muito corrente entre críticos e encenadores deste país e que há anos é
o miolo da relação da imprensa portuguesa com as suas artes performativas.
Passo a explicar: a primeira punheta é o espectáculo levado
a cena por um determinado criador e que mais não é do que uma masturbação
egoísta e solitária de um grau de intelectualísse insuportável. Punheta número
um.
Punheta número dois, o texto que lhe é dedicado por um
jornalista embevecido e deslumbrado, ajoelhado perante o trabalho inalcançável
pelo comum dos mortais, com acesso exclusivo a quem tiver cartão do clube dos
hipsters da intelligentsia do lobby
da teatrice burgueso-lisboeta. Punheta número dois, portanto.
Punheta número três, o acto isolado de quem, como Jorge
Louraço, escreve uma crítica enquanto sonha com uma carreira literária de
sucesso e cantarola baixinho o I’m a lumberjack
and I’m ok dos Monty Python.
É esta a nata da crítica de teatro em Portugal. Indivíduos
que escolhem o que querem ver, sobre o que querem falar, que assumidamente
dizem não a uma série de
espectáculos, encenadores, companhias e festivais de teatro e gritam sim a uns quantos eleitos; que assim
almejam atingir um estatuto de exclusividade de estrela da crítica, que querem
ser temidos, que querem entrar no foyer do Rivoli e ouvir o seu nome repetido
centenas de vezes em sussurro por quem os reconhece e a quem é melhor fazer
todas as vontades na esperança de que possam descer à terra e assistir a um
ensaiozito de dez minutos e escarrar umas quantas postas da mais fina
literatura nas páginas dos jornais mais respeitados. São estes os nossos
críticos de teatro, indivíduos que queriam muito era ter uma carreira na
literatura, venderem milhares de cópias e serem chamados para conferências pelo
mundo fora.
São estes os punheteiros da crítica em Portugal, o par
perfeito para todos os punheteiros do teatro português. É este o casamento de
capa de revista cor-de-rosa que alimenta o teatro e as artes performativas de
um país que do que menos precisava era destes ecossistemas fedorentos. O
espectáculo de John Romão? Permitam-me recorrer ao português mais curto e
assertivo para vos falar dele: o espectáculo de John Romão é uma bela
merda!
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