RESPOSTA A FRANCISCO DE LACERDA - PRESIDENTE DO CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO DOS CTT
Exmo(a). Senhor(a) Francisco de Lacerda,
Eu não sou comunista. Com isto quero dizer que não sofro dessa
maleita que aflige os comunistas e que resulta no desprezo total e absoluto por
tudo o que tenha a ver com a privatização de empresas. Significa isso que de igual
forma não sonho com um mundo em que tudo é Estado e em que a propriedade
privada é uma impossibilidade total. Dito isto, quero que fique bem claro que
não partilho com os comunistas desta visão utópica (ou distópica, como
preferir) do mundo em que vivemos e do papel do Estado nas nossas vidas.
E tudo isto para dizer o quê? Para dizer que recebi a carta
que me enviou e em que me explicou sem hipóteses de confusão o sucesso dos CTT;
como são procurados os serviços dos CTT, como milhões de pessoas e milhares de
empresas comunicam através da rede física e digital dos CTT, como os CTT são a
marca com uma das maiores redes de lojas do país, como são o líder nacional de
encomendas e correio expresso, como as soluções de poupança que os CTT
disponibilizam são cada vez mais procuradas e, por fim, como os CTT conquistam,
ano após ano, a confiança dos portugueses. Tudo isto ficou bem claro, muito
obrigado.
O que não ficou claro na sua carta – e que só pode ter
sucedido por um lapso da sua parte – é a razão ou razões por trás desta
privatização. A ver se eu me explico: a privatização de uma empresa é sempre a
transmissão da posse dessa mesma empresa. Ou seja, deixa de pertencer ao Estado
para passar a ser propriedade de uma entidade privada. O que eu não sabia e
passei a saber é que esta entidade pode ter fins não lucrativos. E não sabia
disto porque, e acho que não estou errado, raramente se tem visto acontecer uma
venda de uma empresa do estado a uma entidade sem fins lucrativos.
Por outro lado há os motivos que normalmente levam o estado
a desfazer-se de propriedade e a vendê-la ao sector privado. Estes motivos,
mesmo que não pensemos muito neles, são os do costume, incapacidade de manter a
gestão da empresa em questão, dificuldade em cobrir os custos, etc, etc, etc. Em
regra estamos a falar de empresas que dão prejuízo ao estado e que estão mesmo
a pedir para serem vendidas a quem as possa transformar noutra coisa qualquer,
de preferência, uma coisa que dê lucro ao seu novo proprietário. E até aqui
tudo bem.
O problema que não é explicado ou sequer referido na carta que
amavelmente me enviou é que tudo leva a crer que os CTT são uma empresa de
sucesso. Ora, se é uma empresa de sucesso, procurada por «milhões de pessoas e
milhares de empresas», custa-me perceber porque quer o estado ver-se livre
dela. Pode ser por incapacidade de manter ordenados e despesas em dia, que nós
sabemos bem como andam os cofres do país. No entanto, e mais uma vez, sendo
esta uma empresa de sucesso – fazendo fé nas suas palavras, claro – e podendo
esse sucesso resultar em bons e gordos lucros para o estado, tudo aponta para
uma gestão danosa dos CTT.
A equação é fácil: empresa de sucesso + incapacidade de
gerir as despesas da empresa pese embora os lucros = má gestão. Simples de
mais? Talvez, mas só tirei 13 a economia e há coisas que me escapam à
compreensão. E é por isso que eu gostava imenso que o senhor, enquanto
presidente do conselho de administração dos CTT, me explicasse bem explicadinha toda
esta trapalhada. Pode ser?
Não se esqueça, não sou comunista e não olho para isto com
todos os pruridos referidos no início desta carta. Mas sabe, é que ainda me
lembro de uma época em que CTT vinha sempre acompanhado de Correios de
Portugal, e apesar de (novamente) não ser comunista – ou socialista, ou social-democrata,
ou popular ou bloquista – cresci a acreditar que há um certo número de serviços
que devem ser providenciados pelo estado, com um máximo de qualidade a um
mínimo de custo para os utentes.
Por isso, só acredito no que diz no início da
sua carta, e que passo a citar «esta oportunidade é para si», se esta
privatização significar que vamos pagar menos pela utilização da vossa rede
física e digital e pelas encomendas que enviamos; se as vossas soluções de
poupança tiverem ainda melhores juros e se, consequentemente, passarmos a
confiar mais nos vossos serviços. Só assim esta privatização será uma
oportunidade para – e fazendo mais uma vez minhas as suas palavras – aceitar o seu «convite» e escrevermos juntos uma «história de sucesso».
Sem outro assunto de momento, aguardo ansiosamente pela sua
resposta.
Atenciosamente,
Nuno Matos
Cidadão
0 Comments:
Enviar um comentário
<< Home