kar(ma)toon

Bom Karma... ou não!

terça-feira, novembro 26, 2013

RESPOSTA A FRANCISCO DE LACERDA - PRESIDENTE DO CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO DOS CTT

Exmo(a). Senhor(a) Francisco de Lacerda,

Eu não sou comunista. Com isto quero dizer que não sofro dessa maleita que aflige os comunistas e que resulta no desprezo total e absoluto por tudo o que tenha a ver com a privatização de empresas. Significa isso que de igual forma não sonho com um mundo em que tudo é Estado e em que a propriedade privada é uma impossibilidade total. Dito isto, quero que fique bem claro que não partilho com os comunistas desta visão utópica (ou distópica, como preferir) do mundo em que vivemos e do papel do Estado nas nossas vidas.

E tudo isto para dizer o quê? Para dizer que recebi a carta que me enviou e em que me explicou sem hipóteses de confusão o sucesso dos CTT; como são procurados os serviços dos CTT, como milhões de pessoas e milhares de empresas comunicam através da rede física e digital dos CTT, como os CTT são a marca com uma das maiores redes de lojas do país, como são o líder nacional de encomendas e correio expresso, como as soluções de poupança que os CTT disponibilizam são cada vez mais procuradas e, por fim, como os CTT conquistam, ano após ano, a confiança dos portugueses. Tudo isto ficou bem claro, muito obrigado.

O que não ficou claro na sua carta ­– e que só pode ter sucedido por um lapso da sua parte – é a razão ou razões por trás desta privatização. A ver se eu me explico: a privatização de uma empresa é sempre a transmissão da posse dessa mesma empresa. Ou seja, deixa de pertencer ao Estado para passar a ser propriedade de uma entidade privada. O que eu não sabia e passei a saber é que esta entidade pode ter fins não lucrativos. E não sabia disto porque, e acho que não estou errado, raramente se tem visto acontecer uma venda de uma empresa do estado a uma entidade sem fins lucrativos.

Por outro lado há os motivos que normalmente levam o estado a desfazer-se de propriedade e a vendê-la ao sector privado. Estes motivos, mesmo que não pensemos muito neles, são os do costume, incapacidade de manter a gestão da empresa em questão, dificuldade em cobrir os custos, etc, etc, etc. Em regra estamos a falar de empresas que dão prejuízo ao estado e que estão mesmo a pedir para serem vendidas a quem as possa transformar noutra coisa qualquer, de preferência, uma coisa que dê lucro ao seu novo proprietário. E até aqui tudo bem. 

O problema que não é explicado ou sequer referido na carta que amavelmente me enviou é que tudo leva a crer que os CTT são uma empresa de sucesso. Ora, se é uma empresa de sucesso, procurada por «milhões de pessoas e milhares de empresas», custa-me perceber porque quer o estado ver-se livre dela. Pode ser por incapacidade de manter ordenados e despesas em dia, que nós sabemos bem como andam os cofres do país. No entanto, e mais uma vez, sendo esta uma empresa de sucesso – fazendo fé nas suas palavras, claro – e podendo esse sucesso resultar em bons e gordos lucros para o estado, tudo aponta para uma gestão danosa dos CTT.

A equação é fácil: empresa de sucesso + incapacidade de gerir as despesas da empresa pese embora os lucros = má gestão. Simples de mais? Talvez, mas só tirei 13 a economia e há coisas que me escapam à compreensão. E é por isso que eu gostava imenso que o senhor, enquanto presidente do conselho de administração dos CTT, me explicasse bem explicadinha toda esta trapalhada. Pode ser?

Não se esqueça, não sou comunista e não olho para isto com todos os pruridos referidos no início desta carta. Mas sabe, é que ainda me lembro de uma época em que CTT vinha sempre acompanhado de Correios de Portugal, e apesar de (novamente) não ser comunista – ou socialista, ou social-democrata, ou popular ou bloquista – cresci a acreditar que há um certo número de serviços que devem ser providenciados pelo estado, com um máximo de qualidade a um mínimo de custo para os utentes. 

Por isso, só acredito no que diz no início da sua carta, e que passo a citar «esta oportunidade é para si», se esta privatização significar que vamos pagar menos pela utilização da vossa rede física e digital e pelas encomendas que enviamos; se as vossas soluções de poupança tiverem ainda melhores juros e se, consequentemente, passarmos a confiar mais nos vossos serviços. Só assim esta privatização será uma oportunidade para – e fazendo mais uma vez minhas as suas palavras – aceitar o seu «convite» e escrevermos juntos uma «história de sucesso».

Sem outro assunto de momento, aguardo ansiosamente pela sua resposta.


Atenciosamente,

Nuno Matos
Cidadão