OS MILITANTES: ASQUEROSOS CÃES DE GUARDA
Há cerca de duas semanas um vídeo com um excerto de uma
entrevista feita a Russell Brand deu nas vistas e, como tudo nas redes sociais,
rapidamente se tornou viral e motivo de discussão. Dissertava o bom do Russell
acerca da descrença completa em que caíram os actores políticos e o sistema
democrático em que assentamos a nossa vida. Na altura apeteceu-me tecer algumas
considerações sobre o assunto, já que também eu defendo, e já há algum tempo, o
que afirma sem vacilar o comediante e actor inglês. Não escrevi logo e
passou-me a vontade. É daquelas coisas…
Passadas estas duas semanas, e passados que estão tantos
dias desde as eleições autárquicas, a minha vesícula alertou-me para o excesso
de bílis que começava a acumular. Estava na hora de escrever o que me vai na
alma relativamente à classe política e em especial a essa doença da democracia
moderna, os militantes.
Em traços muito gerais, o que Russell Brand dizia na
entrevista é que já ninguém devia continuar a prolongar um sistema político, a
democracia, quando este tanto mal nos tem feito. Ou seja, admitindo que de
todos os sistemas políticos este é realmente um mal necessário, a melhor de
todas as más opções, afirmava Brand que a democracia resulta numa simples
mudança de mãos no poder que, no mínimo, mantêm as coisas exactamente como
estavam antes. Mudam os rostos, muda a cor do partido, mas a merda continua a
correr rio abaixo. Mais ou menos isto.
Ora, os militantes servem precisamente para garantir que os
partidos continuam a ser alimentados pela massa humana que garante votos, sem
dúvida, mas que servem igualmente como cor, ruído e como uma oposição por vezes
mais efectiva que aquela que os deputados conseguem levar a cabo na Assembleia
da República. Cabe aos militantes a cegueira política que os leva a cumprir na
perfeição o papel de cãezinhos de guarda dos objectivos do seu partido. São eles
quem pode empolar assuntos, casos e decisões mais ou menos erradas de quem
lidera juntas, câmaras, governo e país.
Algo do género do que se tem visto desde que Rui Moreira
conquistou a câmara do Porto. Desde esse dia, toda uma esquerda portuense e não
só se tem mostrado preocupadíssima com os destinos da invicta. Porquê? Por duas
razões oficias: porque o homem é um agente da direita disfarçado de
independente e porque, como foi apoiado publicamente por Rui Rio, certamente
dará continuidade às medidas que tornaram o seu antecessor no inimigo público
da cidade e dos portuenses.
Pode até ser. Moreira vestiu a pele de político e eu nos
políticos não costumo confiar. Por outro lado, os argumentos de quem já anda a
vender a teoria de que este presidente vai ser uma desgraça para o Porto são
curtos e inquestionavelmente precipitados. E são argumentos dos tais cães de
guarda dos partidos de esquerda, peritos em exacerbar o que se passa e o que
não se passa, condicionados pela cartilha que religiosamente lhes foi enfiada
na moleirinha.
Estes militantes desistem do proverbial «esperar para ver»
que tornou São Tomé uma referência para os pacientes e os prevenidos e partem
para o ataque assim que os resultados das eleições são comunicados. Porque o
seu candidato não venceu, porque são essas as indicações dos líderes que seguem
ou porque pura e simplesmente não conseguem ver para lá da relação clubística
que mantêm com os partidos.
E isto é mais perigoso do que parece à partida. É perigoso
porque são estas pessoas, da esquerda e da direita, que dão força a um sistema
político criado para servir alternadamente uns e outros e que nada faz para
alterar o que está mal. São estas pessoas que, por todas as hipóteses de razões
acima referidas, tão rapidamente criticam um Rui Moreira que não comentou o
despejo da Seiva Trupe – pese embora ainda não fosse oficialmente presidente do
município – como vão desconfiar quando o homem fizer alguma coisa realmente
benéfica para a sua cidade e dizer que são manobras, populismo e sabe-se lá
mais o quê.
Não confio nos políticos. Raramente terei confiado. Mas é
dos militantes que tenho medo. Do seu fundamentalismo, do seu seguidismo e da
capacidade que têm de desprezar aquilo em que acreditam pelo bem do partido. Como
aconteceu quando a adopção por homossexuais foi votada na Assembleia e os
parlamentares da bancada comunista votaram contra e contra a sua convicção
única e simplesmente para agradar ao comité central do partido, envelhecido e
pouco dado a estas modernices. É desta hipocrisia que tenho medo. É desta
hipocrisia de que se alimenta a democracia que tanto louvamos e que na verdade,
e como todos os sistemas políticos, só funciona bem, e no limite, em papel.
Nesse clássico absoluto do cinema que é The Night Of The
Hunter, a personagem interpretada por Robert Mitchum contava a história da mão
direita e da mão esquerda, do amor e do ódio. Na política existem várias mãos,
todas elas iguais, todas elas o mesmo e a mesma merda. Todas elas perigosas e
com objectivos mais do que suspeitos e nada abnegados.
Como o Russell Brand também eu me limito a mandar estas
postas de pescada sem ter uma solução para o problema – e é um problema. Também
eu acredito haver quem seja mais qualificado do que eu e que possa dar passos
em frente e propor alternativas. Também eu acredito num conceito que faz a base
da teoria marxista e que dá pelo nome de ditadura do proletariado. Ditadura do
proletariado que por outras palavras é a tomada pela força dos meios de
produção e o aniquilamento da burguesia. Uma revolução, portanto, que nada tem
de política mas que é popular. Algo de que o português comum já se esqueceu e
que os partidos políticos se esforçam por manter esquecido. Os militantes,
esses, cumprem o seu papel com brio e dedicação.
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