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Bom Karma... ou não!

domingo, novembro 03, 2013

OS MILITANTES: ASQUEROSOS CÃES DE GUARDA

Há cerca de duas semanas um vídeo com um excerto de uma entrevista feita a Russell Brand deu nas vistas e, como tudo nas redes sociais, rapidamente se tornou viral e motivo de discussão. Dissertava o bom do Russell acerca da descrença completa em que caíram os actores políticos e o sistema democrático em que assentamos a nossa vida. Na altura apeteceu-me tecer algumas considerações sobre o assunto, já que também eu defendo, e já há algum tempo, o que afirma sem vacilar o comediante e actor inglês. Não escrevi logo e passou-me a vontade. É daquelas coisas…

Passadas estas duas semanas, e passados que estão tantos dias desde as eleições autárquicas, a minha vesícula alertou-me para o excesso de bílis que começava a acumular. Estava na hora de escrever o que me vai na alma relativamente à classe política e em especial a essa doença da democracia moderna, os militantes.

Em traços muito gerais, o que Russell Brand dizia na entrevista é que já ninguém devia continuar a prolongar um sistema político, a democracia, quando este tanto mal nos tem feito. Ou seja, admitindo que de todos os sistemas políticos este é realmente um mal necessário, a melhor de todas as más opções, afirmava Brand que a democracia resulta numa simples mudança de mãos no poder que, no mínimo, mantêm as coisas exactamente como estavam antes. Mudam os rostos, muda a cor do partido, mas a merda continua a correr rio abaixo. Mais ou menos isto.

Ora, os militantes servem precisamente para garantir que os partidos continuam a ser alimentados pela massa humana que garante votos, sem dúvida, mas que servem igualmente como cor, ruído e como uma oposição por vezes mais efectiva que aquela que os deputados conseguem levar a cabo na Assembleia da República. Cabe aos militantes a cegueira política que os leva a cumprir na perfeição o papel de cãezinhos de guarda dos objectivos do seu partido. São eles quem pode empolar assuntos, casos e decisões mais ou menos erradas de quem lidera juntas, câmaras, governo e país.

Algo do género do que se tem visto desde que Rui Moreira conquistou a câmara do Porto. Desde esse dia, toda uma esquerda portuense e não só se tem mostrado preocupadíssima com os destinos da invicta. Porquê? Por duas razões oficias: porque o homem é um agente da direita disfarçado de independente e porque, como foi apoiado publicamente por Rui Rio, certamente dará continuidade às medidas que tornaram o seu antecessor no inimigo público da cidade e dos portuenses.

Pode até ser. Moreira vestiu a pele de político e eu nos políticos não costumo confiar. Por outro lado, os argumentos de quem já anda a vender a teoria de que este presidente vai ser uma desgraça para o Porto são curtos e inquestionavelmente precipitados. E são argumentos dos tais cães de guarda dos partidos de esquerda, peritos em exacerbar o que se passa e o que não se passa, condicionados pela cartilha que religiosamente lhes foi enfiada na moleirinha.

Estes militantes desistem do proverbial «esperar para ver» que tornou São Tomé uma referência para os pacientes e os prevenidos e partem para o ataque assim que os resultados das eleições são comunicados. Porque o seu candidato não venceu, porque são essas as indicações dos líderes que seguem ou porque pura e simplesmente não conseguem ver para lá da relação clubística que mantêm com os partidos.

E isto é mais perigoso do que parece à partida. É perigoso porque são estas pessoas, da esquerda e da direita, que dão força a um sistema político criado para servir alternadamente uns e outros e que nada faz para alterar o que está mal. São estas pessoas que, por todas as hipóteses de razões acima referidas, tão rapidamente criticam um Rui Moreira que não comentou o despejo da Seiva Trupe – pese embora ainda não fosse oficialmente presidente do município – como vão desconfiar quando o homem fizer alguma coisa realmente benéfica para a sua cidade e dizer que são manobras, populismo e sabe-se lá mais o quê.

Não confio nos políticos. Raramente terei confiado. Mas é dos militantes que tenho medo. Do seu fundamentalismo, do seu seguidismo e da capacidade que têm de desprezar aquilo em que acreditam pelo bem do partido. Como aconteceu quando a adopção por homossexuais foi votada na Assembleia e os parlamentares da bancada comunista votaram contra e contra a sua convicção única e simplesmente para agradar ao comité central do partido, envelhecido e pouco dado a estas modernices. É desta hipocrisia que tenho medo. É desta hipocrisia de que se alimenta a democracia que tanto louvamos e que na verdade, e como todos os sistemas políticos, só funciona bem, e no limite, em papel.

Nesse clássico absoluto do cinema que é The Night Of The Hunter, a personagem interpretada por Robert Mitchum contava a história da mão direita e da mão esquerda, do amor e do ódio. Na política existem várias mãos, todas elas iguais, todas elas o mesmo e a mesma merda. Todas elas perigosas e com objectivos mais do que suspeitos e nada abnegados.


Como o Russell Brand também eu me limito a mandar estas postas de pescada sem ter uma solução para o problema – e é um problema. Também eu acredito haver quem seja mais qualificado do que eu e que possa dar passos em frente e propor alternativas. Também eu acredito num conceito que faz a base da teoria marxista e que dá pelo nome de ditadura do proletariado. Ditadura do proletariado que por outras palavras é a tomada pela força dos meios de produção e o aniquilamento da burguesia. Uma revolução, portanto, que nada tem de política mas que é popular. Algo de que o português comum já se esqueceu e que os partidos políticos se esforçam por manter esquecido. Os militantes, esses, cumprem o seu papel com brio e dedicação.