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Bom Karma... ou não!

domingo, janeiro 12, 2014

A GRAVIDADE NÃO PERDOA

Desconfiei sempre do que se dizia ser o filme do ano, algo nunca visto em cinema e o principal candidato para a corrida a tudo o que é prémios da indústria cinematográfica. Desconfiei sempre porque todas as imagens de Gravity que foram sendo libertadas aos poucos para criar curiosidade, ansiedade e vontade de o ver nunca surtiram efeito em mim. Porque sinceramente sempre me pareceu um filme como outro qualquer e porque nunca consegui sequer imaginar qual seria o grande segredo que o revelaria realmente como a experiência inesquecível de que tanto se falava. 

Agora que o vi, o que posso dizer é que não só as minhas desconfianças tinham razão de ser como não consigo perceber toda a histeria em torno de um objecto banal, corriqueiro, sem segredo ou novidade e que não tem peso suficiente para conquistar os prémios que se antevêem.

Gravity é o regresso à realização do Alfonso Cuarón que nos trouxe duas obras, essas sim, inesquecíveis, Y Tu Mamá También e Children of Men. Seis anos depois deste último, o realizador mexicano propôs-se a trabalhar uma premissa interessante e com os meios de que obrigatoriamente necessitava para o fazer: dois astronautas são os únicos sobreviventes de um acidente em pleno espaço e por lá ficam à deriva lutando contra todas as adversidades e contra as escassas hipóteses da vida lhes correr bem e regressarem à terra.

E pronto, o filme basicamente é isto. E é só isto porque nada nele tem qualquer tipo de profundidade dramatúrgica. As personagens não têm tempo para criarem seja que dimensão dramática for, o argumento é escasso em situações que nos permitam acompanhá-los na sua luta e no seu desespero e o filme mais não é que uma sucessão de incidentes, soluções mais ou menos improvisadas, efeitos especiais iguais a tantos outros e que por essa razão já não nos surpreendem ou nos fazem pensar na velha dúvida mágica que durante tantos anos andava a par com os desenvolvimentos tecnológicos do cinema: «como é que eles fizeram isto?»

Vendo o filme de fio a pavio há uma sensação desconfortável de que falta ali filme. Ou seja, de que tudo é demasiado rápido, escasso e curto para chegar a fazer mossa no espectador. Por outras palavras, é o próprio filme a matar todas as suas potenciais intenções, a não permitir que entremos nele, a impedir-nos de sentir o que aquelas pessoas sentem, a comover-nos com elas e a torcer para que tudo corra bem. É um filme preguiçoso, comodista e feito à pressa, como se quisesse dizer ao mundo «olha mãe, sem mãos» e se espetasse mesmo ao fundo da rampa da garagem.

O final do filme é, ironicamente, uma súmula bastante realista de tudo o que se passa na hora e meia anterior. A última cena lembra-nos como a gravidade nos vence mesmo que não nos apercebamos; lembra-nos de que tudo o que sobe tem de cair, de que somos empurrados para a terra e de que nada podemos contra a sua força. Assim é Gravity, um filme que só subiu ao patamar mais alto na mentira habitual do marketing e que começa a cair ao fim dos seus dez primeiros minutos para se estatelar sem contemplações num último plano parolo e em que todos os elementos presentes – banda sonora, interpretação e argumento – atingem o seu nível mais baixo.


Dito de outra forma, é inevitável ver no título do último filme de Cuarón, uma previsão do que se vai assistir na sua hora e meia: a um filme banal, sem novidade, sem interesse e que só tem um sentido, o descendente.