kar(ma)toon

Bom Karma... ou não!

segunda-feira, dezembro 12, 2005



Às vezes gosto de acreditar que a vida ainda é feita de certezas. As relações entre pessoas, o amor, a amizade, o ódio até. Mas vou aprendendo que nem sempre isso acontece. Por não ser possivel, porque nem toda a gente funciona assim, porque não tem realmente de ser assim.
Mas há certezas que nos fazem falta. A certeza de um toque leve na nossa mão. A certeza de um "adoro-te", de um "fazes-me tanta falta". A certeza cruel de um "odeio-te e não te quero ver mais", porque não? A certeza de que a minha mãe me vai tapar à cama mesmo depois de eu já o ter feito...

Queixamo-nos toda a vida da rotina, dos hábitos repetidos até à exaustão, de comer sempre os mesmos flocos todas as manhãs antes de ir para o mesmo emprego de merda de sempre, sempre no mesmo autocarro, sempre com as mesmas pessoas. Procuramos constantemente coisas novas que nos façam sentir renovados. Um amante, um carro, um desporto radical. Saltamos de cima de um penhasco agarrados a um pedaço de tecido para compensarmos o facto de estarmos fartos das nossas gravatas.

Alguém me perguntava ontem se conhecia pessoas simples. Claro que sim e claro que isso é algo de muito bom. No entanto ninguém é inteiramente simples, da mesma forma que ninguém complicado o é inteiramente. A surpresa é essa. Darmo-nos com alguém que julgamos ser simples, a pessoa mais simples do mundo, para nos apercebermos um dia que naquele particular assunto essa mesma pessoa pode ser mais complicada do que algum dia teríamos imaginado. E é mesmo assim. As relações humanas são de longe as mais complexas. Aliás, acredito fortemente que os animais se devem divertir muito às nossas custas sempre que passa mais um programa da BBC - Vida Humana ou da National Humanographic lá na TV Cabo do mundo animal. Somos naturalmente complicados... mesmo as pessoas simples.

À mesa de um fantástico pequeno almoço, a Ana dizia-me ser uma pessoa simples que se sentia satisfeita com coisas simples como um fantástico pequeno almoço com amigos, com o André, com a vista que ela tem de Lisboa a partir da janela da sua marquise. Todas as pessoas são assim, simples. Não o sabem, mas são. Não se dão ao trabalho de procurar saber o que lhes faz bem, o que os realiza. E assim deixam escapar pequenos, muito pequeninos momentos de absoluta felicidade. Às vezes meros segundos, mas que, contas feitas, valem bem por anos e anos de cinzentismo.

Às vezes gosto de acreditar que a vida ainda é feita de certezas. Às vezes fazem-me falta, como se fossem uma lanterna, daquelas que antigamente nos levavam à cadeira do cinema já escuro, incógnitas, mas que sabíamos sempre que iam lá estar quando chegávamos atrasados e a mão do nosso pai, só, não chegava.
Por outro lado, nunca como agora o efeito da surpresa me deu tanto gozo. E neste jogo entre certezas e falta delas perco a noção de como agir.
Se isso é inteiramente bom ou inteiramente mau...