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Bom Karma... ou não!

terça-feira, agosto 23, 2011

A REVOLUÇÃO APRESSADA

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Eu sei, é complicado chamar revolução apressada a uma guerra civíl que leva já seis meses. A revolução, entenda-se, é este momento de aparente histeria em torno da possível, aparente, queda de Khadafi. De repente, o mundo voltou a acordar para os conflitos na Líbia e para a possibilidade do fim da ditadura do general que todos consideravam um monstro - mesmo que por várias razões não o admitissem. E os líderes mundiais dizem que o poder está nas mãos do povo, e a ONU diz que é preciso ter cuidado com a mudaça do paradigma político líbio e todo o mundo ocidental se rejubila e todo o mundo árabe - ou quase todo - assume com a certeza absoluta que é o fim de uma era.


E no entanto...


E no entanto estas coisas das ditaduras caídas, respeitam as mesmas regras dos policiais, em que um morto deixa de ser um simples desaparecido somente quando aparece o seu corpo. Ou seja, enquanto Khadafi não se render, pedir exílio ou for capturado, a sua ditadura permanece viva e ameaçadoramente presente.


No jornal Público de hoje, uma fotografia de um homem, vestido apenas com uns calções militares - que tanto podiam ser de um guerrilheiro como de um jovem skater - empunhando uma M-60 e a respectiva cinta de balas e montando guarda à escola militar feminina de Tripoli, exemplifica na perfeição a natureza deste conflito. Não há aqui nenhuma da law and order típicas do exército americano, sempre que este é chamado a «democratizar» um país. Aqui é quase como cada um por si e fé no profeta. E no entanto, esta era uma guerra com um desfecho previsto. A questão foi sempre o tempo que levaria até este exército de pés descalços conseguir derrubar um regime violento e que parecia nunca desiquilibrar-se o suficiente para cair do pedestal. E esse tempo, essa demora, fez-nos adormecer e esquecer o assunto. Foi mais ou menos nessa altura que os órgãos de comunicação deixaram de lhe dar honras de abertura ou primeira página, e são esses mesmo órgãos de comunicação, sempre sedentos de coisas desta natureza, que agora nos relembram da Líbia, de Tripoli e de Khadafi. E que nos servem, com a certeza mais absoluta, a queda do ditador e o renascimento de um novo país árabe.


E contudo...


Contudo, ninguém nos explica que estes novos países árabes não sabem ainda como recomeçar do zero. Que a Tunísia e o Egipto continuam atolados numa lama tremenda de confusões, sociais, burocráticas, hierárquicas, e para as quais não estavam, não podiam estar preparados - pese embora contassem com elas. E ninguém parece querer perceber que a Líbia, mais do que qualquer um dos seus vizinhos, recentes vizinhos?, é um caso ainda mais complexo e de difícil resolução. Porque tem ainda menos bases, e ainda menos sólidas, para a reconstrução social e política de que necessita.


A vontade de mudança, expressa a tiros de M-60, morteiros, lança-granadas, chinelos de meter o dedo e peitos destapados é louvável e, por estes dias, coisa de romances históricos. No entanto não chega. Infelizmente não chega. E é aqui que o ocidente pode e deve ajudar. Não na ajuda militar não autorizada - e que parece não ter sido determinante - nem no incendiar da vontade popular, nem no retirar de apoios hipócritas ao líder odiado. É aqui, que o ocidente deve intervir e, sem sobranceria, ensinar um povo que não sabe o que é democracia ou liberdade de opinião, a reorganizar-se e a construir um novo conceito de sociedade. E isto tudo sem perder a sua identidade árabe, sem ocidentalizações deprimentes e, acima de tudo, sem pressa.