Antes de mais aconselho a leitura do comentário que a Ana - a provedora deste blog - deixou no meu post Regresso ao Avante. Já aqui disse, a rapariga sabe do que fala e fala sempre acertadamente.
Quanto à resposta propriamente dita...
Começo por te dizer, minha querida, que não foste mazinha para mim. Sempre te disse que uma das tuas qualidades que mais aprecio é a de dares sempre luta. De teres argumentos fortes e de os defenderes sempre da melhor maneira. E isso está longe de fazer de ti mazinha.
E concordo inteiramente com o que me disseste, querida Ana. A falta de consciência politica é demasiado perigosa para não lhes prestarmos a devida atenção. Mas o problema é que a falta de consciência politica mais grave e preocupante vem precisamente dos politicos.
Sabes, há muitos anos, penso que na década de setenta, o músico negro Gill Scott-Heron - activista racial até mais não - cantava (ou declamava, como preferires) The revolution will not be televised (...) the revolution will be live. Ou seja, a revolução somos nós.
Nós, povo. E sabes, tão bem quanto eu, que as grandes revoluções sempre foram as populares, em qualquer parte do mundo.
Eu não acredito na politica e não acredito nas pessoas, genericamente falando. Acho até - não me querendo afastar muito do tema - que somos de facto a pior coisinha à face da terra. Mas, como disse no tal post, acredito naqueles que acreditam realmente. Acredito que conseguimos mudar o nosso jardim e fazer dele um sitio porreiro. Só que mesmo assim, a maioria das pessoas apostadas em fazer do seu jardim, um sitio bonito, estão-se nas tintas para o jardim do vizinho do lado, e só defendem o seu espaço e, mesmo assim, quando o sentem ameaçado. O conceito solidariedade já há muito que desapareceu do léxico da maioria dos portugueses, e esse foi só o primeiro passo para a perda de consciência politica de que falas, e bem.
Em suma, não me podem cobrar a minha falta de consciência politica quando eu acredito que não devo desenvolver consciência politica por quem não a tem. Nem um bocadinho.
Repara, minha querida, um dos acontecimentos mais tristes a que pude assistir na politica portuguesa, foi o (chamemos-lhe) Barrancos-connection. Se bem te lembras, durante anos o governo PS, conduzido por essa enorme e corajosa figura de estado de seu nome Guterres, arrastou a decisão de levar a cabo a lei. Sim, de facto a tourada de morte é proibida em Portugal, e não havia, à altura, nenhum regime de excepção. Mas as coisas aconteciam, ano após ano, após ano, e o governo do sr. Guterres fazia sempre o mesmo. Varria o lixo para debaixo do tapete. Isto tudo sempre sob o coro de protestos da bela oposição. Assim que o governo PSD, orientado por esse fantástico timoneiro que foi o sr. Barroso, tomou posse, decidiu levar à votação da assembleia o tal regime de excepção para Barrancos, com o argumento sólido e inabalável do peso da tradição. Ou seja, peso da tradição versus vida. Ganhou o peso da tradição. E hoje em dia, morrem todos os anos touros em Barrancos. Onde? Barrancos...
Deste vergonhoso acontecimento importa, quanto a mim, retirar dois factos: os partidos da oposição opõem simplesmente por opor. Assim que assumem cargos no governo decidem, não só fazer igual, como pior. Bem pior. Neste caso, legalizar um assassinio.
O segundo facto, é que o PC, dito partido de esquerda, com ideais de liberdade e partido aparentemente liberal, resolveu, na altura, ser favorável ao dito regime de excepção e que permitia assim que fossem mortos animais para belo prazer dos energúmenos que se deliciam com a morte de um ser vivo, seja ele qual for. Concordarás comigo, por certo, que fosse Barrancos no norte - onde o PC não tem qualquer tipo de peso - e a decisão dos seus dirigentes teria sido bem diferente. Foi uma decisão politica, com o intuito de granjear ainda mais votos em todas as eleições que se seguissem. E é absolutamente nojento. Não encontro outra expressão. Nojento!
E volto a dizer, querida Ana, concordo inteiramente com o que dizes no teu comentário, mas acho que não falaste numa coisa que considero ainda mais importante do que qualquer consciência politica. A consciência social. A consciência do que está correcto e errado. Daquilo que, enquanto senhores do mundo fazemos mal e bem. Fácil, não é cruzar os braços e sentar-me na descrença. Fácil é esquecermo-nos rapidamente da merda que corre o mundo. Repara na atenção dedicada pelos media, por exemplo, aos atentados terroristas que em poucas semanas mataram inúmeras pessoas na Turquia, este Verão. Qual achas que seria o comportamento dos jornais e das televisões - e consequentemente, da opinião pública - se os mesmos atentados tivesse sido perpetrados, como já aconteceu, em Espanha? Ou em Londres? Ou em Tel Aviv?
E como os politicos, varremos o lixo para debaixo do tapete mais próximo e seguimos com a nossa vidinha sem pensarmos uma segunda vez nas imagens que acabaram de nos deixar enjoados enquanto mastigavamos a massa com carne guisada ao jantar. E isso é mais preocupante, bem mais grave, do que a politica, os politicos e a falta de consciência que usamos orgulhosamente ao peito. Eu, assumo a minha culpa. Mais culpado do que muita gente que conheço.
E achas que isso vai mudar? Eu acho, mas para pior. Cada vez vamos fechar mais o nosso jardim, para que os vizinhos não possam espreitar lá para dentro, e para que que não caibam lá mais do que aqueles que consideramos intimos. Até que ficamos sozinhos.
Os politicos, em quem o povo confia de cada vez que vai a votos; que fazem sempre o mesmo folclore de ida-ao-mercado-de-manga-arregaçada-com-beijinho-na-peixeira-e-na-neta-da-mesma; esses politicos que se dedicam a enganar quem os elege por interesses vários; esses politicos não são politicos. São assalariados da politica. E maus profissionais, já agora.
Não me sinto, como nunca me senti, representado por esses assalariados.
Mas acredita, querida, concordo completamente com o teu comentário. E é precisamente isso, essa consciência de que estás correcta, que me faz ser tão descrente e tão desiludido com esta pôrra toda.
E adoro-te, e retribuo os beijinhos revolucionários. E avante, sempre!
2 Comments:
At 14:20, Supirinha Amarela said…
É bom conversar contigo! Continuamos mais tarde???
Beijinhos e um molho de cravos bem vermelhos.
At 16:05, karmatoon said…
Tá combinado, mas prefiro lírios, pode ser?
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