FANTASPORTO' O8
Ora acabou-se o Fantas. Não tive obviamente tempo para vir aqui durante a semana falar dos filmes vistos, pelo que me vejo agora na necessidade de fazer um apanhado de tudo o que de interessante se viu por lá.
A média foi bastante interessante - ao contrário de tantas edições anteriores - e os prémios, no devido enquadramento, aproximadamente lógicos e coerentes. Disso falarei no post seguinte, ok?
Para já, e pela ordem de visionamento, os filmes que mais se destacaram...
Tuya's Marriage - Quanan Hang
Realizado por um cineasta chinês, o filme mostra a vida numa pequena povoação na Mongólia, nomeadamente o dia a dia de Tuya, mulher de um pastor fisicamente incapacitado por um acidente de trabalho. Tuya - magistral desempenho da actriz chinesa, Yu Nan, e que já está a filmar com os irmãos Wachowski - leva uma vida tornada pesada pela deficiência do marido, e vê-se a braços não só com o trabalho de dona de casa, como também de tudo o que ele fazia, inclusive tratar do rebanho de ovelhas, a sua principal fonte de rendimento.
Em parte contra a sua vontade, Tuya aceita a ideia de divorciar-se e casar-se pela segunda vez para melhor poder ajudar a sua familia. A única condição é a de que o seu pretendente aceite o ex-marido e o ajude no seu problema.
O filme é de uma beleza imensa, os actores são fantásticos e o realizador utiliza as gigantescas paisagens da Mongólia quase como se de um personagem se tratasse. Merecidamente, "Tuya's Marriage" foi Urso de Ouro no festival de Berlim, e estranhamente deixou o Fantasporto sem um único prémio ou menção honrosa. Vá-se lá perceber...
REC - Jaume Balagueró e Paco Plaza
Realizador fetiche do festival, o catalão, depois de alguns filmes menos bem conseguidos e semelhantes em todos os aspectos, volta a surpreender o espectador com uma obra que, não sendo totalmente original, se torna em mais um digno representante de um novo género de cinema - embora, muito provavelmente, tenha servido também para o esgotar. Aproveitando a mesma fórmula de "The Blair Witch Project" e do mais recente "Cloverfield", "REC" é uma espécie de reportagem televisiva que acaba por estar no pior local e à pior hora possiveis.
Bem filmado, dominado por um ritmo avassalador e assustador como o caraças, "REC" falha apenas em dois não tão pequenos pormenores: não consegue nunca enganar o espectador, e convencê-lo de que o que está a ver é mais do que apenas um filme, e perde metade do interesse no preciso momento em que nos é explicado o que realmente se está a passar. Não chega para o estragar, no entanto. O filme tem os dez minutos finais mais intensos e assustadores da história do cinema espanhol, e deixa o espectador mais experiente pregado à cadeira, de olhos arregalados e respiração ofegante. Na sala, não foram poucas as vezes que se ouviram gritos e impropérios de todas as espécies, sempre que as pessoas saltavam das suas cadeiras num exercício de coreografia perfeito.
Apresentou-se desde logo como um dos filmes talhados para vencer o festival, e vai ter, felizmente, uma merecida carreira cá pelo burgo. Não o percam, se fazem favor.
Music Within - Steven Sawalich
Biografia de Richard Pimentel, um americano que dedicou a sua vida a lutar pelos direitos dos deficientes no seu país, e que conquistou muito mais do que se podia algum dia imaginar. Através do filme ficamos a saber que algures até à década de setenta, havia nos EUA uma coisa chamada de "Ugly Law", que permitia ao proprietário de um restaurante, por exemplo, expulsar um cliente que, por apresentar uma deficiência de qualquer espécie, incomodasse os restantes clientes. O filme, apesar do assunto sério, é uma comédia ao estilo de "Forrest Gump", igualmente com uma banda sonora de eleição e que merecia outro destaque. Ao invés foi exibido a um Domingo à tarde e para meia dúzia de espectadores.
Opium: The Diary Of a Madwoman - Janos Szasz
Já não é surpresa, a filmografia húngara ser de tão boa qualidade. É normal pelo menos um bom filme por ano no Fantas. Este "Opium..." foi um dos melhores desta última edição, denso, incómodo, filmado com um cuidado e uma beleza incomuns, dada a temática, e servido por dois excelentes actores.
Passado num hospital psiquiátrico do início do século XX, o filme acompanha um momento menos bom na vida de um médico, escritor famoso e morfinómano que, afligido por um bloqueio criativo, decide passar uns dias na dita instituição na tentativa de escrever um novo livro. o encontro com uma paciente «especial» completa a história, e oferece-nos uma estranha mas poderosa história de amor/loucura.
Interview - Steve Buscemi
Uma autêntica peça de teatro. Realizado e co-escrito pelo famoso realizador americano, "The Interview" é um duelo contínuo entre um jornalista arrogante e a sua entrevistada, uma emergente actriz de novelas amercianas, não tão fútil quanto parecia à partida. Passado quase na sua totalidade no apartamento da jovem actriz - a bonitinha Sienna Miller -, "The Interview" é uma obra feita de conversa; uma óptima conversa, com momentos absolutamente geniais e bem representados - por Miller e pelo próprio Buscemi - e que têm o condão de conseguir prender o espectador ao assento.
You, The Living - Roy Andersson
Ou mais um exemplo de como o cinema nórdico é um dos mais interessantes do mundo. Assumidamente surreal, com um sentido de humor muito próximo do de Jacques Tati, e arrojado na sua estética feia e fria, "You, The Living" conquistou prémios em diversos festivais, inclusive o de melhor realizador no Chicago International Filme Festival. Não se pode facilmente dizer que seja um filme sobre qualquer coisa especifica. É um filme sobre pessoas, filmado em quadros estáticos - apenas três sequências apresentam movimentos de câmara - e com um sentido de humor irresistivelmente nonsense. Os gags, apresentados em série, perdem algum do fulgor inicial, mas a recta final volta a adquirir uma força esmagadora, e o filme compensa a perda de alguma comicidade com uma mensagem fortíssima e uma sequência de imagens fortes e que ficam na retina muito depois do seu final.
O melhor filme do festival, caso não tivesse havido "Band's Visit".
Room 205 - Martin Barnewitz
Mais um óptimo representante nórdico no Fantas deste ano. Atípico filme de terror, filmado com um cuidado estético anormal e com uma banda sonora pairante e nada comum em filmes do género, "Room 205" escapa, por isso mesmo, ao saco onde se costumam armazenar filmes de terror passados no seio de uma comunidade estudantil. E são tantos e sem idéias...
Este é diferente, não no tema, mas claramente na forma como ele é apresentado. Não resiste a cair numa ou outra situação algo ridícula, mas contas feitas, é uma bom exemplo do terror clássico, de fazer arrepiar e saltar nas cadeiras.
The Mist - Frank Darabont
Primeiro, e por ser realizado e escrito pelos mesmos responsáveis de "The Shawshank Redemption" e "The Green Mille" - respectivamente Frank Darabont e Stephen King -, prometia ser interessante.
Depois de conhecido o argumento, e principalmente depois de terem visto as primeiras imagens, surgiu alguma sensação desagradável de frustração entre os que aguardavam ansiosamente por mais uma adaptação de um livro do mestre incontestado da literatura de terror.
Algures numa pequena povoação dos EUA, uma tempestade dá origem a uma névoa misteriosa e que abriga um sem número de criaturas hediondas. Um grupo de sobreviventes é obrigado a refugiar-se no supermercado local, e a lutar, não só contra as tais criaturas, como também contra o espirito humano, que em situações de adversidade rapidamente regride até ao seu estado mais violentamente primitivo.
A Stephen King sempre lhe atrairam estas situações de conflito de grupo dentro de um conflito ainda maior e nada agradável para os intervenientes. Neste caso, a coisa até foge aos habituais chavões em que inúmeros realizadores caiem sempre que pretendem adaptar mais uma obra sua, e o filme torna-se num gigantesco episódio da "Twilight Zone". É divertido, é assustador masnão em demasia, tem suspense, tem fanáticos religiosos que falam com Deus, e tem um ambiente fechado (pelo nevoeiro) e denso o suficiente para agradar aos fãs de um bom clássico de série B.
Bom para pipocas!
A média foi bastante interessante - ao contrário de tantas edições anteriores - e os prémios, no devido enquadramento, aproximadamente lógicos e coerentes. Disso falarei no post seguinte, ok?
Para já, e pela ordem de visionamento, os filmes que mais se destacaram...
Tuya's Marriage - Quanan Hang
Realizado por um cineasta chinês, o filme mostra a vida numa pequena povoação na Mongólia, nomeadamente o dia a dia de Tuya, mulher de um pastor fisicamente incapacitado por um acidente de trabalho. Tuya - magistral desempenho da actriz chinesa, Yu Nan, e que já está a filmar com os irmãos Wachowski - leva uma vida tornada pesada pela deficiência do marido, e vê-se a braços não só com o trabalho de dona de casa, como também de tudo o que ele fazia, inclusive tratar do rebanho de ovelhas, a sua principal fonte de rendimento.
Em parte contra a sua vontade, Tuya aceita a ideia de divorciar-se e casar-se pela segunda vez para melhor poder ajudar a sua familia. A única condição é a de que o seu pretendente aceite o ex-marido e o ajude no seu problema.
O filme é de uma beleza imensa, os actores são fantásticos e o realizador utiliza as gigantescas paisagens da Mongólia quase como se de um personagem se tratasse. Merecidamente, "Tuya's Marriage" foi Urso de Ouro no festival de Berlim, e estranhamente deixou o Fantasporto sem um único prémio ou menção honrosa. Vá-se lá perceber...
REC - Jaume Balagueró e Paco Plaza
Realizador fetiche do festival, o catalão, depois de alguns filmes menos bem conseguidos e semelhantes em todos os aspectos, volta a surpreender o espectador com uma obra que, não sendo totalmente original, se torna em mais um digno representante de um novo género de cinema - embora, muito provavelmente, tenha servido também para o esgotar. Aproveitando a mesma fórmula de "The Blair Witch Project" e do mais recente "Cloverfield", "REC" é uma espécie de reportagem televisiva que acaba por estar no pior local e à pior hora possiveis.
Bem filmado, dominado por um ritmo avassalador e assustador como o caraças, "REC" falha apenas em dois não tão pequenos pormenores: não consegue nunca enganar o espectador, e convencê-lo de que o que está a ver é mais do que apenas um filme, e perde metade do interesse no preciso momento em que nos é explicado o que realmente se está a passar. Não chega para o estragar, no entanto. O filme tem os dez minutos finais mais intensos e assustadores da história do cinema espanhol, e deixa o espectador mais experiente pregado à cadeira, de olhos arregalados e respiração ofegante. Na sala, não foram poucas as vezes que se ouviram gritos e impropérios de todas as espécies, sempre que as pessoas saltavam das suas cadeiras num exercício de coreografia perfeito.
Apresentou-se desde logo como um dos filmes talhados para vencer o festival, e vai ter, felizmente, uma merecida carreira cá pelo burgo. Não o percam, se fazem favor.
Music Within - Steven Sawalich
Biografia de Richard Pimentel, um americano que dedicou a sua vida a lutar pelos direitos dos deficientes no seu país, e que conquistou muito mais do que se podia algum dia imaginar. Através do filme ficamos a saber que algures até à década de setenta, havia nos EUA uma coisa chamada de "Ugly Law", que permitia ao proprietário de um restaurante, por exemplo, expulsar um cliente que, por apresentar uma deficiência de qualquer espécie, incomodasse os restantes clientes. O filme, apesar do assunto sério, é uma comédia ao estilo de "Forrest Gump", igualmente com uma banda sonora de eleição e que merecia outro destaque. Ao invés foi exibido a um Domingo à tarde e para meia dúzia de espectadores.
Opium: The Diary Of a Madwoman - Janos Szasz
Já não é surpresa, a filmografia húngara ser de tão boa qualidade. É normal pelo menos um bom filme por ano no Fantas. Este "Opium..." foi um dos melhores desta última edição, denso, incómodo, filmado com um cuidado e uma beleza incomuns, dada a temática, e servido por dois excelentes actores.
Passado num hospital psiquiátrico do início do século XX, o filme acompanha um momento menos bom na vida de um médico, escritor famoso e morfinómano que, afligido por um bloqueio criativo, decide passar uns dias na dita instituição na tentativa de escrever um novo livro. o encontro com uma paciente «especial» completa a história, e oferece-nos uma estranha mas poderosa história de amor/loucura.
Interview - Steve Buscemi
Uma autêntica peça de teatro. Realizado e co-escrito pelo famoso realizador americano, "The Interview" é um duelo contínuo entre um jornalista arrogante e a sua entrevistada, uma emergente actriz de novelas amercianas, não tão fútil quanto parecia à partida. Passado quase na sua totalidade no apartamento da jovem actriz - a bonitinha Sienna Miller -, "The Interview" é uma obra feita de conversa; uma óptima conversa, com momentos absolutamente geniais e bem representados - por Miller e pelo próprio Buscemi - e que têm o condão de conseguir prender o espectador ao assento.
You, The Living - Roy Andersson
Ou mais um exemplo de como o cinema nórdico é um dos mais interessantes do mundo. Assumidamente surreal, com um sentido de humor muito próximo do de Jacques Tati, e arrojado na sua estética feia e fria, "You, The Living" conquistou prémios em diversos festivais, inclusive o de melhor realizador no Chicago International Filme Festival. Não se pode facilmente dizer que seja um filme sobre qualquer coisa especifica. É um filme sobre pessoas, filmado em quadros estáticos - apenas três sequências apresentam movimentos de câmara - e com um sentido de humor irresistivelmente nonsense. Os gags, apresentados em série, perdem algum do fulgor inicial, mas a recta final volta a adquirir uma força esmagadora, e o filme compensa a perda de alguma comicidade com uma mensagem fortíssima e uma sequência de imagens fortes e que ficam na retina muito depois do seu final.
O melhor filme do festival, caso não tivesse havido "Band's Visit".
Room 205 - Martin Barnewitz
Mais um óptimo representante nórdico no Fantas deste ano. Atípico filme de terror, filmado com um cuidado estético anormal e com uma banda sonora pairante e nada comum em filmes do género, "Room 205" escapa, por isso mesmo, ao saco onde se costumam armazenar filmes de terror passados no seio de uma comunidade estudantil. E são tantos e sem idéias...
Este é diferente, não no tema, mas claramente na forma como ele é apresentado. Não resiste a cair numa ou outra situação algo ridícula, mas contas feitas, é uma bom exemplo do terror clássico, de fazer arrepiar e saltar nas cadeiras.
The Mist - Frank Darabont
Primeiro, e por ser realizado e escrito pelos mesmos responsáveis de "The Shawshank Redemption" e "The Green Mille" - respectivamente Frank Darabont e Stephen King -, prometia ser interessante.
Depois de conhecido o argumento, e principalmente depois de terem visto as primeiras imagens, surgiu alguma sensação desagradável de frustração entre os que aguardavam ansiosamente por mais uma adaptação de um livro do mestre incontestado da literatura de terror.
Algures numa pequena povoação dos EUA, uma tempestade dá origem a uma névoa misteriosa e que abriga um sem número de criaturas hediondas. Um grupo de sobreviventes é obrigado a refugiar-se no supermercado local, e a lutar, não só contra as tais criaturas, como também contra o espirito humano, que em situações de adversidade rapidamente regride até ao seu estado mais violentamente primitivo.
A Stephen King sempre lhe atrairam estas situações de conflito de grupo dentro de um conflito ainda maior e nada agradável para os intervenientes. Neste caso, a coisa até foge aos habituais chavões em que inúmeros realizadores caiem sempre que pretendem adaptar mais uma obra sua, e o filme torna-se num gigantesco episódio da "Twilight Zone". É divertido, é assustador masnão em demasia, tem suspense, tem fanáticos religiosos que falam com Deus, e tem um ambiente fechado (pelo nevoeiro) e denso o suficiente para agradar aos fãs de um bom clássico de série B.
Bom para pipocas!
Etiquetas: Filmes Vistos
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