kar(ma)toon

Bom Karma... ou não!

segunda-feira, junho 19, 2006

Acerca do Levanta-te e Ri...



... e do estado da comédia em Portugal.

Considero-me uma pessoa exigente, no que a comédia diz respeito, e tenho uma forma estranha de ser espectador das coisas da comédia. Como exemplo, posso-vos dizer que embora respeite o trabalho do Fernando Rocha - acredito mesmo ser o rapaz um bom entertainer, com qualidades mais do que comprovadas - não me lembro nunca de me ter rido das anedotas que ele conta. No entanto, já por várias vezes reagi a um improviso seu, ou a uma reacção sua a uma provocação vinda do público, com uma sonora gargalhada. Rio-me do disparate, do imediato, do inesperado.
Rio-me dos Monty Python, mas não consigo sequer ver Benny Hill; adoro Woody Allen e detesto Mr. Bean; Pátio das Cantigas, sempre, teatro de revista, nunca!

Quanto a stand up comedy...
Sempre, desde miúdo, fui acérrimo seguidor desta nobre arte de entreter através da simples conversa. Um comediante que sobe a um palco para falar connosco. Nada mais. Certo, pode fazê-lo de variadissimas formas e em diversos registos, mas a verdade é que não faz mais do que falar connosco.
E foi isso que não compreenderam as pessoas que se dizem ter dado início ao movimento em Portugal.
E porque associar o Levanta-te e Ri (LR) ao nascimento do stand up em Portugal é um tanto ao quanto presunçoso.
Porque antes, muito antes, do programa ser criado, já o Fernando Rocha enchia o Coliseu do Porto com as suas anedotas e isso fez com que os bares da zona do Porto percebessem que isso lhes podia ser bastante proveitoso. E foi.
Quem mora cá para o norte sabe bem, que não havia esplanada, não havia barzinho de praia, que não esgotasse a sua capacidade à conta do rapaz Rocha.

Ora, parece-me que a televisão percebeu esse fenómeno e tratou de arriscar um programa cuja filosofia fosse a mesma dos bares que tinham essas noites de humor.
E conseguiu-o. As primeiras emissões do LR eram muito semelhantes aos programas da Comedy Central, verdadeiras montras do que se faz pelos Estados Unidos.
O problema é que nem tudo o que ia ao programa era stand up. Pronto se quiserem precisar, quase tudo o que por lá passava era trabalho de actor em palco, imitando stand up. Até hoje confesso nunca ter visto um actor, com essa formação e com essa experiência, safar-se como stand up comediant. Os restantes, que não levavam o texto escrito por um guionista encomendado, iam para contar anedotas ao pior estilo dos Malucos do Riso, ou historinhas do Alentejo profundo.
O povo ria.

Mesmo assim...
A cena cresceu. Os bares começaram a pedir mais do que somente o Fernando Rocha, os cachets dispararam - afinal os meninos que iam à televisão não podiam actuar uma horita para a populaça por tostão e meio.
Ou seja, criou-se um monstro. Um monstro sem piada, por falar nisso. Como alguém disse este fim de semana, começou-se a casa pelo telhado, e ainda por cima - digo eu - um telhado de má qualidade. Prova dessa má qualidade reside na conotação atribuida pela maioria dos portugueses ao fenómeno stand up: são anedotas, são caralhadas, são uma cambada de grunhos a falar de gajas, sexo e afins. Com isso, temos metade da população que não abre as portas a outros tipos de comédia, e outra metade que nem quer ouvir em falar em comediantes no bar lá da esquina.
O telhado, meus amigos, é de muito má qualidade.

A minha opinião - e nesta altura alerto-vos para as primeiras linhas deste texto - é que, e por muito que me tentem convencer, a quase totalidade dos nomes que passaram pelo palco do LR, uns mais vezes, outros nem por isso, foram de fraquissima qualidade. Pese embora o sucesso popular que possam ter tido. Para mim esse sucesso era resultado directo da gigantesca lupa de aumento chamada TV.
Não acreditam? Então digam-me quantos desses comediantes vão continuar a ter visibilidade televisiva assim que o LR finar? Arrisco o número zero, embora concorde que, tendo em conta a (falta de ) lógica das televisões essa previsão possa andar longe da realidade.
Basta ver o que fizeram os «filhos» do LR sempre que quiseram arriscar outros formatos televisivos, e não só. Alguns exemplos chegam a ser embaraçosos. As raras excepções, não têm outro remédio a não ser submeter-se às regras de televisão e, invariavelmente, esfumam-se ainda antes de conseguirem algum reconhecimento.

Não é segredo nenhum. Também eu já me meti neste estranho mundo da comédia. Se quiserem nesta neo-comédia à portuguesa. Também eu pretendo continuar a tentar. Resultados à parte, considero ter sido, do ponto de vista pessoal, uma óptima experiência. Descobri pessoas, sensações e paixões novas. No entanto, continuo a ser principalmente um espectador de comédia, e como espectador de comédia, não gosto do que por cá se faz. Não gosto.

Quanto ás questões que se têm levantado acerca do excesso de influências transpirado pelos mais diversos comediantes da nossa praça, acerca deste final anunciado (e temido) do LR, chega-me dizer que não é nada que me surpreenda grandemente. Os que me conhecem e comigo partilharam palco e criação de sketches cómicos, sabem, como souberam sempre, que a minha opinião, esta aqui descrita, permanece a mesma há quase dois anos.

Comédia portuguesa? Só se me surpreenderem, muito obrigada.
E se se estão a perguntar o porquê deste texto, entrem no blog do Carlos Moura e leiam a opinião
dele acerca do assunto.
E já agora, e para perceberem a visão de outra pessoa inserida neste meio, o senhor Miguel Barros, saltem já para o site do programa de televisão O Quadrado das Bermudas e participem no seu
fórum.