BLAH, BLAH, BLARGH DO MUNDIAL
Comecemos pela frieza dos números: Portugal foi eliminado do Mundial na África-do-Sul tendo marcado sete golos, sofrido apenas um e perdido somente um jogo, o último e que não podia mesmo perder. Soa razoavelmente bem, não soa? Ironicamente, a frieza dos factos contraria a frieza dos números: em quatro jogos Portugal venceu um, empatou dois (a zero) e perdeu outro.
Ou seja, a selecção portuguesa mostrou a sua habilidade para defender, a sua incapacidade em marcar golos e ainda que foi intérprete de uma anormalidade rara em jogos dos mundiais: uma vitória por 7-0. De resto, jogou de forma desencantada, cinzenta e sensaborona. Isto não vos faz lembrar nada?
Pois, o povo, encantado com a bola, rapidamente se esquece que apenas algumas semanas antes do início do Mundial, não tinha qualquer confiança na sua selecção. E porquê? Fácil, porque todos os jogos da fase de apuramento foram desencantados, cinzentos e sensaborões... e chatos, feios, entediantes e por vezes desesperantes. Sejamos sinceros; deixemos aquele estado febril tão típico do adepto que torce pela sua selecção mesmo nos dias de folga futebolística e encaremos a verdade de todos os factos: a selecção de Carlos Queiroz limitou-se a jogar como fez durante meses e meses. Intermináveis meses, diga-se.
Quanto ao jogo com a Espanha...
Apesar de tudo o que foi dito atrás, o jogo com os so called campeões da Europa deixou novamente, e à imagem do que já havia sucedido com o Brasil, o sabor a oportunidade perdida. Porque apesar de termos uma posição no ranking FIFA inferior à Espanha, porque apesar de não termos tantos jogadores de primeira linha quanto a Espanha; porque apesar de não termos um treinador tão bom quanto o espanhol; porque apesar de tudo, mais uma vez, temos qualidade suficiente para os levar de vencido. Não o fizemos por medo, respeito ou cautela, todos em excesso.
É claro, nesta altura somos a capital mundial das teorias e contra-teorias desenhadas em torno de um jogo de futebol. E sim, todos passamos a ser comentador desportivo ou, com a devida coragem e loucura, treinador de sofá. Sim, todos queremos destilar o fel que nos incomoda o palato e sim, todos temos os nossos suspeitos do costume. No entanto, e novamente, a verdade dos factos.
Ninguém tem dúvidas que a selecção não devia ter jogado com um tronco de árvore morta chamado Ricardo Costa, verdadeiro buraco defensivo, sem velocidade, sem presença física, sem a mais pequena sombra de ameaça a David Villa, somente o melhor jogador espanhol da actualidade. Queiroz aparentemente não sabia de nada disto. Que Costa já tinha provado contra o Brasil não estar preparado para um andamento destes e que Villa é um avançado saído de um filme de terror. Agradeceu o seleccionador espanhol- literalmente, aliás, e a todos os orgãos de comunicação - e o avançado, que teve uma rara oportunidade de poder jogar à bola como já não fazia desde pequenino: no recreio da escola, perfeitamente à vontade e a gozar com o seu oponente directo, o puto com dois pés esquerdos que se senta sempre na fila da frente da sala de aulas.
Também ninguém tem dúvidas quanto ao momento que parece ter definido a sorte do jogo: Hugo Almeida sai de campo e imediatamente Portugal perde a pouca genica ofensiva que ainda demonstrava - mesmo que a espaços. A partir daí foi um deserto de ideias, discernimento e lógica; Portugal aos 58 minutos já jazia ferido de morte e ainda nem havia sofrido o golo, verdadeiro golpe de misericórdia.
Portugal voltou a cometer o erro dos jogos com a Costa do Marfim e Brasil: respeito excessivo e injustificado. Bem fazia Scolari, a quem nada ou niguém parecia meter medo e que se estava nas tintas para nomes, categorias ou rankings. Entrava em campo para ganhar e mais nada, fosse contra fosse. Queirós é um menino de coro, de fraca figura, fraco discurso e obviamente sem quaisquer valências no capítulo da motivação pessoal. Fraquinho...
De qualquer forma tudo isto serviu para provar o que eu já havia previsto: Portugal estava à espera da derrota para soltar os piores impropérios dirigidos a jogadores e seleccionador. Subitamente Ronaldo é o pior do mundo, Simão não joga nada, Deco nem lá devia estar e Liedson nunca se devia ter naturalizado. Reflexo disso mesmo é a exultação (merecida) de outros intervenientes - Eduardo e Coentrão à cabeça. O exagero da elevação destes e de outros jogadores à condição de heróis da nação, é a forma que o povo encontra para tentar humilhar aqueles que, segundo a sua lógica condicionada, atraiçoaram as esperanças lusas.
É certo, Ronaldo nunca chegou a demonstrar todo o seu potencial e mostrou-se desmotivado e pouco esclarecido. No entanto, culpar o madeirense pelo fracasso da selecção, é assumir aquilo que não admitimos a ninguém: que a selecção é órfã de Cristiano. O CR7 - ou 9 ou lá o que é - jogou mal e devia mesmo ter saído no jogo com a Espanha. Mas se pensarmos bem, nem Maradona, absolutamente louco, mandaria Ronaldo para o balneário antes do fim do encontro. Por inúmeras razões e que se juntam todas num momento; no momento que muitas vezes pode definir o resultado de um jogo e que está sempre à espreita no ponta da chuteira de um grupo muito reduzido de jogadores.
Por isso mesmo, fazer de Ronaldo um Judas e atacá-lo como muitos têm feito é claramente um exagero nascido da frustração. Figo, melhor do que ninguém, o fez, esquecendo-se do que disse quando a selecção de que era capitão, foi eliminada sem qualquer glória do Mundial em 2002. Conseguiu ser ainda mais arrogante e sobranceiro e roçou a má-educação. Mas isso agora não interessa nada; há que encontrar um culpado e mandá-lo à fogueira, rapidamente.
Um jogador, capitão ou não, é humano e tem direito ao disparate. Especialmente quando o disparate acontece num momento tão sensível quanto o final de um jogo importante. Sabedores disso, os jornalistas salivam pela pergunta certa no momento certo à hora certa, na certeza de que algo de saboroso vai sair dali. Especialmente quando é público que as relações de alguns jogadores com o seu treinador são obviamente azedas. Por muito que as conferências de imprensa sejam só sorrisos e boa disposição.
Vejamos: Deco criticou uma decisão técnica e logo se arranjou uma lesão impeditiva por três jogos; Hugo Almeida afinal não estava cansado - a decisão de o substituir, assumida por Queiroz, estava desenhada muito tempo antes do apito inicial do árbitro; Nani, será para sempre o grande mistério da participação da selecção portuguesa neste mundial. Algo cheira a podre nisto tudo, e não parece razoável acreditar que não teve nada a ver com o rendimento da equipa.
Voltemos à verdade dos factos: a Espanha é, na realidade, melhor que Portugal. E não estamos a falar de meras estatísticas. Portugal nunca jogou satisfatoriamente, nem na fase de apuramento, nem na fase de grupos do mundial. A selecção escolhida por Queiroz foi polémica desde o dia em que a anunciou ao país, e claramente desequilibrada - a falta de um ponta-de-lança com resultados comprovados, aliás, foi sempre uma dor de cabeça incurável.
Posto isto, era realmente de esperar que Portugal pudesse ir mais longe do que foi? Era. Mas por uma questão que nada tem a ver com a qualidade da equipa. Podia ter ido mais longe se tivesse ganho ao Brasil e, consequentemente, defrontado o Chile nos oitavos-de-final; podia ter ido mais longe se a atitude mental, táctica e técnica no confronto com a Espanha tivesse sido outra. A culpa não é exclusiva de Carlos Queiroz, claro, mas ninguém pode dizer que não estava à espera. Essa é a prova máxima da incapacidade do seleccionador nacional: o conhecimento - e, logo, a desconfiança - da forma de agir de Queiroz e da sua maneira de ser. Não são as equipas de futebol - e de todos os desportos, aliás - a face dos seus treinadores? Pois então...
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