VENHA O PRÓXIMO...

Não foi condenável, por isso, que muita gente tenha olhado com desconfiança para o anunciado projecto em torno de Sherlock Holmes. Apesar do elenco e apesar do gordo orçamento ao dispôr de Guy Ritchie. Ou seja, não consigo imaginar um responsável da Warner Bros. a passar um cheque de 100 milhões de dólares para um qualquer filme de Ritchie. Mas ainda bem que o fez.
Confessando desde já nunca ter lido os contos de Sir Arthur Conan Doyle - embora seja fã absoluto das aventuras do detective - admito não saber quem é o verdadeiro Sherlock Holmes. É verdade, o cinema e a televisão sempre trataram Holmes como um homem enigmático, genial mas louco, com especial apetência para o consumo de algumas drogas de classe alta e, acima de tudo, um gentleman. Confesso também que de todos, o meu favorito sempre foi (e continuará a ser) o desempenhado pelo falecido Jeremy Brett, na famosa série transmitida já algumas vezes em Portugal.
No entanto, Sherlok Holmes sempre me pareceu ser um antepassado menos musculado e bruto de James Bond. Ora, Guy Ritchie não deve saber o que é um gentleman, e o mais próximo que esteve de um, deverá ter sido ao lado de um provável mordomo da ex-mulher, Madonna. Por isso, e pelo evidente carácter sujo que gosta de imprimir aos seus filmes, Guy Ritchie foi mesmo pela versão Bond da coisa, e construíu um novo - e talvez polémico - Sherlock Holmes.
O Holmes de Ritchie e Robert Downey Jr. é desleixado (com a sua vida pessoal), pouco organizado (na sua intimidade), bêbado, não tem problemas em meter as mãos na sujidade e em aviar alguns vilões com uma combinação letal de conhecimentos de anatomia e boxe e aprecia mulheres - algo nunca claramente assumido anteriormente. Ou seja, mantém todas as características de génio da investigação e do raciocínio e acrescenta algumas particulariedades mais, digamos, humanas. Para além disso, Robert Downey Jr. é um dos actores mais excitantes e entusiasmantes da actualidade, e mexe-se nestas andanças com uma facilidade maravilhosa.
O resto...
O resto é um filme enérgico, realizado unicamente para ser um objecto de entretenimento, com uma ideal noção de ritmo, mas sem os exageros que se reconhecem a Ritchie, e muito, muito bem filmado. Como se repente Guy Ritchie descobrisse a noção de elegância e a misturasse com sucesso com a energia que normalmente transporta para as suas obras. Inevitavelmente, o filme ameaça perder o fôlego duas ou três vezes, mas até isso parece ser pensado, já que rapidamente volta a ganhar velocidade e interesse. A velocidade e o interesse que mantém desde o primeiro segundo. Aliás, a primeira sequência do filme avisa desde logo os mais distraídos que isto não é um filme cerebral, mas sim um objecto duro, moderno e revolucionário - tendo em conta de que é, no fim de contas, uma história com Sherlock Holmes.
É um argumento pequeno e trapalhão, no entanto; algo quenão supreende, já que Guy Ritchie sempre trabalhou com histórias pequenas, em torno de muitas personagens que, essas sim, lhe davam vida e detalhe. Aqui, infelizmente, não existem muitas personagens, e o filme ressente-se. E ressente-se, acima de tudo, de ser uma obra nitidamente construída como primeiro episódio de uma saga. O que não é de todo mal pensado, diga-se. O problema é que este "Sherlock Holmes" foi com toda a certeza mutilado na mesa de montagem, e o final é uma correria desenfreada - da realização, não das personagens (mas também) - piorada por um final abrupto bem ao estilo de intervalo para publicidade.
Ainda assim, é uma belíssima obra e um excelente exemplo de como se pode fazer um blockbuster de acção sem perder o estilo, o tino e o objectivo: manter o espectador acordado. E apetece ver Robert Downey Jr. e Jude Law nos papéis principais, novamente. E apetece ver Mark Strong a desempenhar aquilo para o qual o actor inglês parece ter nascido: ser o vilão de serviço de qualquer filme.
Já agora, uma curiosidade e que tem precisamente que ver com Mark Strong. O actor que desempenha o papel de Lord Blackwood seria um excelente Sherlock Holmes, caso o realizador quisesse optar pelo detective frio, distante e cavalheiro intocável.
Ah, e fiquem até ao fim para assistirem ao genérico, brilhante, e estejam atentos à magnífica banda sonora de Hans Zimmer.
2 Comments:
At 21:14,
Paulo Pereira said…
Devias ser pago para escrever isto, Nuno.
Abraço
At 18:26,
karmatoon said…
Obrigado amigo.
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