CUBA, 1958 - 2008

Hoje, passados cinquenta anos da queda de Batista, percebo que grande parte desse fascínio resulta do que apenas 3000 homens conseguiram face ao poder militar de 80 000. Vale sempre a pena lembrar o que a vontade destes homens e o seu amor pelo seu país fez acontecer. Foi um acontecimento épico, digno das páginas da historia e que faz lembrar tão bem o que 300 espartanos fizeram na cara de milhares de persas.
Romance à parte, interessa, acima de tudo, pensar no que é o país Cuba desde que Fidel Castro assumiu a liderança da ilha. É importante perceber porque ao longo de cinco décadas as mudanças não foram o que todo o povo cubano - e todos os que mais ou menos secretamente apoiaram a revolução - estava à espera. De uma ditadura totalmente egocêntrica e violentamente opressiva, Cuba passou para uma ditadura que pode até nem ser egocêntrica - embora tenha sido desenhada por um homem só e à imagem da sua casmurrice - mas que continua a ser violentamente opressiva. Uma ditadura que continua a ser apoiada por um comunismo mundial que continua a recusar o facto de que está morto, e que só se coloca ao lado de Castro, que só lhe perdoa as consecutivas violações dos direitos humanos mais básicos, porque continua a ser uma das formas mais declaradas de anti-americanismo. Eu também me irrito com a prepotência americana e com a forma como se continuam a achar donos do mundo. Contudo, este tipo de comportamento anti é típico de quem não tem argumentos para contrariar o rufia que bate em tudo e todos no recreio da escola. E é ridículo.
Basta saber um bocadinho de história para percebermos que esse mesmo comunismo que é tão ferrenho no seu anti-americanismo, sempre se comportou da mesma forma que o seu eterno inimigo. Desde o fim da segunda guerra mundial a URSS sempre se dedicou a expandir o seu território e, mais do que isso, a sua ideologia e a sua forma de fazer política, a sua economia e a sua visão do que são os direitos básicos da humanidade. Alguém ainda se lembra da «cortina de ferro» e o que significava para os países ocupados pelos regimes-fantoche fieis a Moscovo? Ou seja, os dois lados que alimentaram a guerra fria durante cinquenta anos são exactamente iguais e no entanto... é irónico, não é? As pessoas e a sua curta e tão oportuna memória.



Por esta altura, os que conseguiram ler este texto até aqui devem estar a pensar "pois, o maldito embargo". Desenganem-se. O boicote político-económico que dura há quase tanto tempo quanto a revolução dos barbudos, faz cada vez menos sentido. Pelas razões que se conhecem e por mais uma: porque não é de facto o causador de todos os males cubanos, como algumas classes políticas e sociais querem fazer parecer. O embargo é a melhor maneira que os dirigentes cubanso têm de responsabilizar o vizinho pelo mal que se passa no seu próprio quintal. Na realidade, a ilha apenas esteve vedada ao mundo durante a famosa crise dos mísseis, em 1962. De lá para cá muita coisa mudou, nomeadamente o facto dos EUA serem o país que clandestinamente mais negoceia com Cuba. Legalmente, porém, a coisa fica ainda mais curiosa, já que a América é o maior exportador de alimentos para a ilha de Fidel e o sexto maior parceiro económico. Na verdade, os problemas graves por que passam os cubanos resultam tanto ou menos desse famigerado embargo do que da corrupção e da falta de liberdade impostos pelo regime castrista. Na ânsia de manter os seus cubanos num regime à prova de capitalismo, Fidel Castro cortou-lhes todas as ligações com a humanidade, sujeitando-os a um estilo de vida miserável e de constante sacrifício. Sacrifício que ele e os altos cargos dos seus sucessivos governos nunca tiveram de fazer, claro está. Para além disso, nos últimos 50 anos, mais de 15% da população cubana fugiu do país, e é precisamente dessa população - da população considerada traidora pelo regime - que vem o maior contributo financeiro para o regime. Só da comunidade residente nos EUA chegam anualmente aos cofres cubanos 1000 milhões de dólares.
Cuba vive em três patamares tão distintos quanto desiquilibrados. O povo, na miséria constante e que por força da forma como encara as dificuldades se considera o mais bem humorado de toda a América Latina - são várias as anedotas criadas para cada uma das evidências da miséria em que vivem - todos os que estão de uma forma ou outra ligados ao governo e os turistas. Os últimos visitam Cuba como se olhassem para um aquário. Passam férias em Varadero, onde tudo é bonito, tudo é limpo, tudo é perfeito até ao dia em que o recepcionista lhes agarra a mão com força e na surdina lhe implora por algum dinheiro para leite em pó. Sempre com um sorriso turístico, claro, que não se pode desapontar os hóspedes. Os dependentes/relacionados/agarrados do/com/ao governo vivem uma vida de regalias. São os turistas que vivem na parte mais bonita do aquário. Uma dessas tais anedotas, quase trágica, reza assim: "Posso tratá-lo por senhor ou prefere camarada?" Resposta: "Senhor. Camarada é aquele que vai no Mercedes".
Cuba continua a não ratificar as principais convenções internacionais sobre liberdade e direitos políticos. Organizações como a Amnistia Internacional, a Human Rights Watch e Repórteres Sem Fronteiras continuamente acusam o regime cubano de manter pelo menos 58 prisioneiros de consciência e a violentamente perseguir qualquer tipo de opositores. A pena de morte permanece válida em Cuba, e embora a última execução tenha acontecido em 2003, meia centena de condenados à pena capital continua à espera da sua vez. Entre eles, estão homossexuais e, imagine-se, alguns desses prisioneiros de consciência.

Fontes: Visão e Público
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